Quando o Profeta Muhammad recebeu a ordem de Deus para liderar a comunidade muçulmana em cinco orações diárias, suas preces foram direcionadas para a cidade sagrada de Jerusalém, que é um local importante para os muçulmanos. Assim como a casa de vários profetas do Islam, como Dawud (David), Sulayman (Salomão) e Isa (Jesus), a cidade era um símbolo dos profetas do passado do Islam. Quando o Profeta Muhammad fez a viagem milagrosa durante a noite, de Meca a Jerusalém, e a subida para o céu (conhecida como Isra wal Miraj), a cidade adquiriu uma importância acrescida como o lugar onde o Profeta liderou alguns dos profetas anteriores em oração e, em seguida, subiu ao Céu.
Para os muçulmanos, no entanto, Jerusalém continuaria a ser um símbolo distante durante a vida do Profeta e os anos imediatamente após a sua morte. À medida em que eles passaram a controlar o Iraque e, em seguida, a Síria, por volta do ano 630, Jerusalém se tornaria uma cidade muçulmana e a Mesquita al Aqsa, em Jerusalém, se tornaria um dos mais importantes pedaços de terra no império muçulmano. Ao longo da história complexa e devastada pela guerra nesta cidade, a Mesquita tem sido uma peça central da luta por Jerusalém. Com os muçulmanos, cristãos e judeus, todos considerando a terra sob a Mesquita como especialmente santa, compreender sua história é de extrema importância.
Este artigo irá olhar para a história da mesquita antes da chegada do Profeta Muhammad, do período pré-islâmico até a vinda dos cruzados, em 1099.
Para os muçulmanos, o Islam não era uma nova religião dos anos 600, quando o Profeta Muhammad começou a pregar em Meca. Em vez disso, ele é visto como uma continuação das tradições dos profetas anteriores, que são reverenciados por todas as três religiões monoteístas. A mensagem de Muhammad só continua e aperfeiçoa as mensagens de Ibrahim (Abraão), Musa (Moisés) e Isa (Jesus), que tinham sido corrompidas ao longo dos tempos. Assim, para os muçulmanos, o Templo de Salomão, que foi construído no Monte do Templo de Jerusalém nos tempos antigos era, de fato, parte da sua própria história religiosa.
Com essa mentalidade, quando os muçulmanos conquistaram a cidade de Jerusalém, em 637, durante o califado de Umar ibn al Khattab, eles procuraram ressuscitar a cidade como um lugar de culto. O antigo templo de Jerusalém foi reconstruído várias vezes, mais recentemente, por Herodes, em torno do ano 20 aC. Por volta do ano 70 dC, no entanto, os romanos destruíram o templo depois de uma revolta judaica na Palestina. Os judeus foram proibidos de entrar na cidade e todo o judaísmo foi suprimido em Jerusalém.
A área onde o templo foi construído foi mantida como um terreno baldio durante os próximos cem anos. Os romanos usavam a área como um depósito de lixo e, por isso, quando Umar entrou na cidade e foi ver onde seus antepassados religiosos, como Dawud e Sulayman, adoraram a Deus (que também foi o lugar onde Muhammad rezou durante a Isra wal Miraj), ele encontrou uma área suja e inutilizável como uma mesquita. No entanto, ele decidiu limpar a área e construiu a Mesquita al Aqsa. Como era seu costume, ele trabalhou ao lado dos muçulmanos na limpeza e purificação da área. Eles ergueram uma mesquita simples que poderia caber cerca de 3000 pessoas no extremo sul do Monte do Templo, agora conhecida pelos muçulmanos como Haram al Sharif, o Santuário Nobre. Um peregrino cristão contemporâneo descreveu a mesquita como uma grande estrutura de madeira construída sobre ruínas anteriores.
Os muçulmanos não veem isso como desprezo aos locais sagrados de outras religiões. Uma vez que os mesmos profetas que são mencionados no Antigo Testamento da Bíblia são aceitos como profetas muçulmanos, a nova mesquita foi vista como uma continuação desses lugares iniciais de adoração. Isto estava de acordo com um dos temas centrais do Islam – que era a perfeição das religiões monoteístas anteriores.
Durante décadas, esta estrutura simples construída por Umar continuou a ser o edifício principal no Haram. Em 690, no entanto, o califa Abd al Malik, da dinastia Omíada, reconstruiu a Mesquita al Aqsa, muito maior e mais estável do que a mesquita que Umar tinha construído. O plano básico da mesquita atual provém dessa reconstrução em particular. O grande marco de Abd al Malik foi, no entanto, construir cerca de 200 metros para o norte.
Acima da rocha em que alguns muçulmanos acreditavam que o Profeta Muhammad subiu ao Céu, Abd al Malik construiu a magnífica Cúpula da Rocha. Como parte da Mesquita al Aqsa, não era uma casa separada de culto, nem era o objetivo de competir com a Mesquita al Aqsa, mas foi concebida como um complemento a ela. Usando as tradições arquitetônicas e mosaicos que os omíadas tinham aprendido com os bizantinos, que governaram a área antes deles, o Domo imediatamente se tornou um dos pontos focais da arquitetura islâmica nos anos 600.
O Domo da Rocha foi construído logo no cume do complexo Haram e é, portanto, um dos edifícios mais impressionantes e notáveis da cidade. Tem uma pegada octogonal, a partir da qual se ergue uma cúpula de 20 metros que foi originalmente coberta de folhas de chumbo. É adornado em caligrafia tanto no interior como no exterior do edifício, com algumas das inscrições do Alcorão mais antigas existentes dentro da cúpula do edifício. Dada a grandiosidade do edifício, alguns historiadores modernos têm argumentado que Abd al Malik o construiu para ser um rival para a Caaba, em Meca. Porém, se ele tivesse a intenção de fazê-lo, estudiosos muçulmanos da época certamente expressariam indignação e gravariam suas intenções blasfemas em livros escritos durante esse tempo. No entanto, não existe nenhum relato contemporâneo de que ele tivesse tal intenção, e os primeiros a falarem dessa ideia o fizeram 200 anos mais tarde por alguém com um forte viés anti Omíada.
Após a queda dos Omíadas, em 750, Jerusalém ficou sob o controle da dinastia abássida. Os novos califas abássidas fizeram sua capital na cidade iraquiana de Bagdá e não colocaram tanta ênfase em Jerusalém, como os omíadas tinham feito. Como tal, o Haram não recebeu a atenção e o dinheiro que tinha durante o período dos Omíadas. No entanto, apesar da negligência que recebeu dos califas, Jerusalém continuou a ser um importante local de peregrinação e a Mesquita al Aqsa, em si, manteve-se como o centro da vida islâmica na cidade dos anos 600 através dos anos 900, apesar de muitos terremotos durante este período, que exigiram várias renovações.
Jerusalém e o Haram al Sharif tiveram um tumultuado final de século nos anos 900. O império fatímida, que foi baseado no Egito, tomou o controle de Jerusalém em 970, depois de derrotar as tropas abássidas na cidade vizinha de Ramla. Os fatímidas pertenciam à seita Ismaili do xiismo, que muitos estudiosos islâmicos, historicamente, têm classificado como fora do rebanho do próprio Islam. Períodos de governo fatímida tiveram repercussões catastróficas para a Mesquita al Aqsa.
Desde o início do domínio muçulmano em Jerusalém, a mesquita e o Haram em geral tinham sido centros de conhecimento islâmico. Estudiosos estabeleciam escolas regularmente na mesquita para ensinarem os alunos desde o básico da gramática árabe aos tópicos avançados em lei islâmica e teologia. Durante o período dos fatímidas, esses esforços educacionais foram cortados pelos governadores e substituídos por estabelecimentos oficiais xiitas. O geógrafo al Muqaddasi escreveu em 985 que, em Jerusalém, “juristas permanecem sem visitas, homens piedosos não possuem renome e as escolas não são frequentadas, pois lá não existem mais aulas.”* Ele continua a lamentar a falta de educação islâmica na cidade que tinha sido frequentada por estudiosos como al Shafi no passado.
O pior período do governo fatímida acabou sendo o reinado de al Hakim, que começou em 996. Ele foi muito além dos governantes fatímidas anteriores em sua opressão ao Islam ortodoxo. Declarou-se divino, exigindo que o seu nome substituísse o nome de Deus em sermões de sexta-feira, proibiu o jejum muçulmano no Ramadan e os muçulmanos estavam impedidos de irem a Meca para a peregrinação. Até o final de seu governo, em 1021, a cidade de Jerusalém ainda tinha tudo, mas perdeu seu status como um centro de estudos islâmicos. Além disso, ele também oprimiu cristãos e judeus em Jerusalém e destruiu a Igreja do Santo Sepulcro, em conflito direto com a lei islâmica e as promessas de Umar em 637.
Após o desastroso reinado de al Hakim, vieram alguns líderes fatímidas mais moderados, que foram mais tenros com a própria mesquita e sua história islâmica. Nos anos 1030, depois de um terremoto desastroso, a Mesquita al Aqsa foi renovada pelos fatímidas. A estrutura resultante tinha uma nave central e 7 grandes arcos em sua fachada, que sustentavam o telhado maciço. Isto foi inferior aos maciços 14 arcos que foram originalmente construídos pelos Omíadas. A mesquita de hoje é mais ou menos inalterada a partir da construção fatímida.
Em 1073, Jerusalém foi conquistada pelos turcos seljúcidos, que eram recém convertidos ao islamismo sunita dominante da Ásia Central. Do ponto de vista islâmico, al Aqsa agora estava de volta às mãos capazes de um poderoso estado sunita, que trouxe de volta os estudiosos islâmicos à cidade. As escolas foram estabelecidas na área do Haram para ensinarem as escolas de jurisprudência islâmica Shafi e Hanafi, e a vida intelectual na cidade começou a florescer novamente. Estudiosos começaram a emigrar para a cidade para aprender, bem como para ensinar a todo o mundo muçulmano. Notavelmente, Abu Hamid al Ghazali se mudou para a cidade em 1095. Ele viveu no Haram ao longo da parede oriental da cidade e passou os próximos anos em oração e em reclusão no Domo da Rocha e na Mesquita de al Aqsa. Durante este tempo, ele escreveu o incrivelmente influente “The Revival of the Religious Sciences” (A Renascência das Ciências Religiosas, em tradução direta), que revolucionou a forma como os muçulmanos se aproximaram de temas como espiritualidade, filosofia e Sufismo.
A revitalização da vida muçulmana intelectual em torno da Mesquita al Aqsa não duraria, no entanto. A própria natureza islâmica do Haram logo seria apagada em 1099 com a chegada dos cruzados.
* Armstrong, 258
Armstrong, Karen. Jerusalem: One City, Three Faiths. New York: Alfred A. Knopf, 1996. Print.
Montefiore, Simon Sebag. Jerusalem: The Biography. New York: Vintage Books, 2011. Print.
Traduzido de Lost Islamic History
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