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Abu Bakr Al Siddiq: A história do primeiro Califa do Islam

Abu Bakr foi sogro e melhor amigo do Profeta Muhammad. Ele também foi o primeiro califa do Islam, e durante seu governo o Alcorão foi compilado.
  • Abu Bakr entrou para a história islâmica como o melhor amigo e sogro do Profeta Muhammad.
  • Ele foi o primeiro homem adulto a aceitar o Islam e jamais negou a veracidade da Revelação.
  • Ainda que não seja citado pelo nome, ele é um dos poucos companheiros do Profeta mencionados no Alcorão.
  • Ele também foi o primeiro califa a governar os muçulmanos e reprimiu revoltas, garantiu bem estar social e fez a primeira compilação escrita do Alcorão.

Entre os companheiros do Profeta Muhammad (sahabas) mais importantes, certamente estava Abu Bakr, que entrou para a história da religião por ser o primeiro homem adulto a crer no Mensageiro de Allah, por ajudar várias pessoas a se converterem ao Islam, por acompanhar Muhammad na fuga de Meca para Medina e por ser o primeiro califa da história. 

Sua nobreza fez com que o próprio Profeta Muhammad lhe desse o título de “Al Siddiq” que, em português, significa “o verdadeiro”. Abu Bakr era o melhor amigo do Mensageiro de Allah e, ao longo de sua vida, também se tornou seu sogro ao ceder sua filha Aisha para se casar com o Profeta. Os dois também estiveram juntos nas batalhas de Badr e Uhud, duas das mais importantes da história da religião.

A importância de Abu Bakr para os sunitas é imensurável e todos aqueles que seguem esta vertente religiosa devem ter admiração pela figura deste companheiro, que confiou em Muhammad em todos os momentos da missão profética e também deixou um legado de nobre conduta, agindo sempre de acordo com os preceitos do Islam e sendo um exemplo para todos os muçulmanos.

Vida pregressa

Nascido no ano de 537, na cidade de Meca, Abu Bakr era membro de uma família rica da tribo Banu Taym, da confederação tribal dos coraixitas. Seu pai se chamava Uthman Abu Quhafa ibn Amir e sua mãe era Salma Umm al Khair bint Sakhar. 

Seu nome verdadeiro era Abdullah ibn Uthman, mas durante a infância, viveu com os beduínos, algo muito comum entre os árabes daquele tempo. Ele gostava muito de brincar com os animais de criação do povo com quem vivia e tinha um carinho especial pelos camelos, o que lhe rendeu o apelido de “Abu Bakr” que, em português, significa “pai dos filhotes de camelos”.

Assim como muitas outras pessoas de famílias ricas de seu tempo, Abu Bakr era alfabetizado e gostava de poesia. Ele nunca foi um adorador de ídolos e era um hanifa – nome dado aos árabes monoteístas que seguiam a religião entregue pelos profetas Abraão e Ismael e que rejeitavam os cultos politeístas.

Abu Bakr era um grande amigo de Muhammad e essa proximidade entre os dois foi importante para que Abu Bakr se tornasse uma das primeiras pessoas a se converter ao Islam. Mais tarde, sua posição de destaque na sociedade de Meca seria fundamental para que outras pessoas pudessem aderir à religião. 

Abu Bakr e a divulgação do Islam

Representação da Caaba na era pré-islâmica (Foto: Life in Saudi Arabia)

Por ser um dos primeiros homens livres a se tornar muçulmano, Abu Bakr também teve a oportunidade de convidar alguns de seus amigos íntimos a abraçarem a religião. Na época do tribalismo na Arábia, os homens livres contavam com a proteção dos membros de sua tribo, o que funcionava como uma garantia de que ninguém poderia cometer nenhuma agressão contra ele.

Ele também gastou boa parte de sua riqueza libertando alguns escravos que haviam se convertido ao Islam, dando-lhes a chance de também terem proteção. Ao comprar a liberdade das pessoas, Abu Bakr costumava dar prioridade para as pessoas mais frágeis, como as mulheres e os idosos, o que era um sinal de seu amor pela causa de Deus.

Durante os três primeiros anos da revelação do Alcorão, os muçulmanos mantiveram sua fé em segredo, temendo represálias dos pagãos de Meca. Quando a religião começou a ser divulgada abertamente, Abu Bakr foi o primeiro a fazer um discurso público em defesa de Deus e do Profeta Muhammad em meio à Caaba.

O discurso de Abu Bakr causou enorme alvoroço e os muçulmanos que estavam na Caaba foram agredidos pelos pagãos. O melhor amigo do Profeta foi o mais prejudicado pela confusão e acabou sendo espancado e pisoteado até perder a consciência.

Perseguição e lealdade ao Islam

A tensão entre os pagãos foi crescendo com o passar do tempo e, no ano de 617, a tribo do Profeta Muhammad, os Banu Hashim, começou a sofrer um duro boicote por parte do restante dos mequenses para que retirassem a proteção concedida ao Mensageiro de Allah. Durante dois anos, as tribos de Meca não estabeleciam comércio com os hashemitas, nem consumavam casamentos com qualquer um de seus membros. 

Foi nesta época que os muçulmanos fizeram a imigração para a Abissínia (atual Etiópia). Abu Bakr pretendia ir para o Iêmen e, em seguida, se juntar ao restante do grupo no país africano. Mas, no meio do caminho, ele encontrou um velho amigo chamado Ad Dughna, que era líder da tribo Qarah, que o convenceu a voltar para Meca sob sua proteção. 

Emocionado com a proposta, Abu Bakr aceitou e voltou para Meca. Ele construiu uma pequena mesquita ao lado de sua casa, na qual frequentemente declamava versos do Alcorão, e muitas pessoas que passavam por perto eram capazes de escutar. O melhor amigo do Profeta tinha uma voz doce que atraía muitas pessoas a ouvirem a recitação, o que logo preocupou os pagãos. 

Os coraixitas disseram a Ad Dughna que Abu Bakr deveria orar dentro de casa para não ferir os costumes da sociedade de Meca. O guardião foi até o companheiro do Profeta e alertou-lhe sobre o pedido dos coraixitas, mas Abu Bakr não cedeu e disse que, se este era o preço para ter proteção, então ele a dispensava.

Abu Bakr: O Verdadeiro

Representação otomana da Viagem Notura do Profeta Muhammad

Os muçulmanos acabaram voltando para Meca sob uma falsa promessa de paz com os coraixitas, mas os pagãos continuaram com o boicote. No ano de 620, a situação se agravou ainda mais quando o tio do Profeta, Abu Talib, faleceu. Um mês depois, a esposa do Mensageiro de Allah também morreu e, por causa disso, esse período ficou conhecido como o Ano da Tristeza.

Devastado por suas perdas recentes e pelo receio da perseguição constante dos coraixitas, o Profeta se deitou perto da Caaba em uma determinada noite e dormiu. O Mensageiro de Allah foi acordado, ainda durante aquela noite, pelo Anjo Gabriel, que o levou até Jerusalém, onde conduziu uma oração com todos os profetas anteriores enviados por Deus.

Em seguida, o Profeta Muhammad foi elevado aos céus, teve visões sobre a vida e a morte, o paraíso e o inferno, e viu que os homens seriam julgados por tudo que fizeram em vida. Então, à medida em que subia aos céus, o Mensageiro de Allah encontrou novamente com outros profetas, até que chegou ao limite da criação, quando se encontrou com Deus. Ali, Muhammad recebeu a ordem de estabelecer as cinco orações diárias aos muçulmanos. 

Quando os incrédulos duvidando e zombando do milagre de Muhammad, logo foram atrás de Abu Bakr para ver qual seria sua reação e, para a surpresa deles, o melhor amigo do Mensageiro de Allah respondeu: “Se ele disse isso, então disseste a verdade”. Por ser um crente verdadeiro e determinado, o Profeta lhe deu o título de “Al Siddiq” (O Verdadeiro), que ele manteve pelo resto de sua vida.

A Hégira

Os muçulmanos de Yathrib propuseram um acordo com o Profeta Muhammad para que os companheiros de Meca se mudassem para a cidade deles para escaparem da perseguição. O Mensageiro de Allah começou a autorizar que eles buscassem refúgio na nova cidade, que mais tarde ficaria conhecida como Medina an Nabi, ou Cidade do Profeta.

Diante deste cenário, Abu Bakr começou a pedir permissão repetidamente ao Mensageiro de Allah para que pudesse migrar, mas Muhammad sempre lhe respondia da mesma maneira: “Não se apresse! Allah Todo-Poderoso lhe dará um companheiro.” Quando finalmente o Profeta Muhammad recebeu permissão de Deus para ir para Yathrib, ele foi até Abu Bakr e se preparou para fazer a imigração com seu grande amigo. 

Neste dia, os coraixitas haviam deslocado um membro de cada tribo para matar o Profeta pois, desta forma, ninguém precisaria pagar pelo dinheiro de sangue derramado. Eles cercaram a casa do Mensageiro de Allah, que conseguiu escapar milagrosamente. Ao recitar alguns versos do Alcorão, Muhammad passou despercebido por seus inimigos e conseguiu fugir.

Junto com Abu Bakr, eles se refugiaram por três dias na Caverna de Thawr, pois estavam sendo perseguidos pelos coraixitas. Ao final do terceiro dia, vários perseguidores se aproximaram da entrada do esconderijo, mas viram que ali havia uma teia de aranha e um ninho de pombo, o que fez com que se afastassem, pois não acreditavam que alguém poderia ter entrado ali sem destruir a teia e o ninho. 

Após 15 dias, o Profeta e Abu Bakr chegaram em Yathrib, um evento que foi celebrado com euforia pelos muçulmanos que os aguardavam. O evento da Caverna de Thawr foi relatado por Deus no Alcorão e, embora o nome de Abu Bakr não seja citado, ele é um dos poucos companheiros mencionados no Livro Sagrado do Islam: “Quando estava na caverna com um companheiro, ele disse: Não te aflijas, porque Allah está conosco!” (Alcorão 9:40)

Vida em Medina

Cúpula do Túmulo do Profeta Muhammad em Medina (Foto: Shutterstock)

Em Medina, Abu Bakr se tornou comerciante de tecidos e se casou com Habibah bint Kharijah. Em 623, ele cedeu sua filha Aisha em matrimônio ao Profeta Muhammad, mas ela já lhe havia sido jurada três anos antes. A consumação estreitou ainda mais a boa relação entre os dois amigos.

Batalhas

Abu Bakr esteve em combate nas batalhas de Badr e Uhud, duas das principais que os primeiros muçulmanos enfrentaram na cidade de Medina contra os pagãos de Meca. Na primeira, eles saíram vencedores e Abu Bakr era parte do grupo que escoltava pessoalmente o Mensageiro de Allah.

Em Uhud, os muçulmanos perderam o combate para os coraixitas. Na ocasião, o Profeta Muhammad deu ordens aos arqueiros para que guardassem a posição em que estavam, mas eles não o fizeram, o que permitiu que os pagãos avançassem em direção à vitória. Somente algumas dezenas de muçulmanos permaneceram ao lado do Mensageiro de Allah neste momento e Abu Bakr foi um deles.

Ele também esteve ao lado de Muhammad nas Batalhas de Khaybar, contra grupos judeus que pretendiam atacar Medina; na Conquista de Meca, quando os idólatras coraixitas foram finalmente derrotados, e também participou de várias expedições menores.

Morte do Profeta

Em 632, o Profeta ficou doente e não conseguiu mais conduzir as orações, então pediu para Abu Bakr que o fizesse. Em um dia que se sentiu melhor, o Mensageiro de Allah foi até a mesquita para conduzir as orações mas, ao ver Abu Bakr, sinalizou para seu melhor amigo para que ele continuasse.

Ao final da oração, o Profeta subiu ao púlpito e disse: “Há um servo cujo Senhor lhe deu a opção entre esta vida e a vida no outro mundo perto do Senhor, e o servo escolheu a última”. Ao ouvir essas palavras, Abu Bakr entendeu que significavam que o Mensageiro de Allah não viveria muito tempo a mais, e respondeu: “Santo Profeta, como podemos viver sem você?”. 

O Profeta consolou seu amigo e ordenou que todas as portas da mesquita fossem fechadas, exceto a que dava para a porta da casa de Abu Bakr. Poucos dias depois, o Mensageiro de Allah faleceu, enquanto seu melhor amigo estava na cidade de Al Sukh. Quando soube da notícia, ele ficou extremamente triste e voltou para Medina.

A liderança de Abu Bakr após a morte do Profeta

Quando os muçulmanos souberam o que aconteceu, eles se reuniram na mesquita, todos em profunda tristeza pelo que havia ocorrido. No entanto, houve quem duvidasse que o Profeta havia morrido, como no caso de Omar Ibn Al Khattab. Em determinado momento, Abu Bakr apareceu e disse: “Se alguém adorar Muhammad, Muhammad está morto. Mas se alguém adorar a Deus, Deus está vivo, e é imortal”

Abu Bakr concluiu recitando um verso do Alcorão que dizia: “Muhammad não é senão um Mensageiro, a quem outros mensageiros precederam. Porventura, se morresse ou fosse morto, voltaríeis à incredulidade? Mas quem voltar a ela em nada prejudicará Allah; e Allah recompensará os agradecidos.” (Alcorão 3:144)

Outro companheiro do Profeta, Ibn Abbas, disse que quando Abu Bakr recitou este verso parecia que Allah nunca o havia revelado antes.

O primeiro califa do Islam

Batalha das trincheiras
(Foto: Reprodução)

Uma fragmentação na comunidade islâmica se instaurou após a morte do Profeta. Temendo que o sucessor não fosse alguém amplamente respeitado pelos muçulmanos, Abu Bakr e Omar se articularam rapidamente para que o califa fosse algum membro da tribo do Mensageiro de Allah – os coraixitas, que se converteram ao Islam após a conquista de Meca.

Para que isso acontecesse, Omar, seguido por outros companheiros, juraram fidelidade a Abu Bakr e ele logo foi aceito pela maioria como o primeiro califa.

Em seu governo, ele atacou as tropas bizantinas na Síria. Este empreendimento havia sido iniciado pelo Profeta Muhammad, que chegou a mobilizar as tropas para o combate, mas durante sua vida, não chegaram a sair de Medina. Ele também lutou contra os sassânidas na Mesopotâmia.

Várias tribos iniciaram revoltas contra Medina após a morte do Profeta, algumas movidas por motivos religiosos, encabeçadas por líderes que questionavam a autoridade religiosa do Islam e reivindicavam ser profetas. A principal delas foi contra o falso profeta Musalimah, que foi morto na sangrenta batalha Yamama contra um exército muçulmano em menor número; e a outra foi a falsa profetisa Sajah, que acabou se convertendo ao Islam.

Outros grupos se revoltaram por motivos políticos. Algumas tribos haviam abraçado o Islam somente por prestígio político e, logo após a morte do Profeta, renunciaram à religião. Houve quem não aceitasse a liderança de Abu Bakr e também havia pessoas ricas que não queriam mais pagar a caridade do Zakat, alegando que este era um dinheiro devido ao Profeta.

Abu Bakr não fez uso da guerra somente para vencer seus inimigos, mas também da diplomacia, fazendo alianças políticas, concedendo terras e incentivos financeiros. Ele garantiu estabilidade social nos domínios islâmicos, protegeu-os dos inimigos e garantiu a expansão islâmica iniciada pelo Profeta Muhammad.  

Compilação do Alcorão 

Na Arábia, a tradição de transmitir o Alcorão era fortemente oral e as pessoas costumavam decorar o livro através da memorização, portanto, não havia um livro escrito considerado oficial. A ordem estipulada por Deus foi ensinada em vida pelo Profeta e os muçulmanos chegaram a fazer manuscritos do Livro Sagrado.

Abu Bakr foi o primeiro a compilar o Alcorão, uma medida que foi importante para difundir o Islam e manter sua coesão.

Morte

Em 634, após governar por pouco mais de dois anos, Abu Bakr ficou gravemente doente e, após 15 dias, faleceu. Sua oração fúnebre foi conduzida por Omar e ele foi enterrado na casa de Aisha, ao lado do Profeta Muhammad. Ele teve a honra de ser o melhor amigo do Mensageiro de Allah em vida e teve, também, o privilégio de ser enterrado ao seu lado.

Conclusão

Abu Bakr foi um dos homens mais leais a Deus, ao Profeta Muhammad e ao Islam. Ele aceitou a mensagem do Alcorão desde o princípio e foi o primeiro homem adulto a se tornar muçulmano. Foi o melhor amigo do Mensageiro de Allah durante toda a sua vida e se tornou seu sogro ao ceder sua filha Aisha em casamento. 

Os dois amigos estiveram juntos durante a hégira, a fuga de Meca para Medina, e acabaram se escondendo em uma caverna para fugir da perseguição dos inimigos pagãos. Este momento foi registrado por Deus no Alcorão, fazendo com que Abu Bakr fosse um dos poucos companheiros do Profeta a serem mencionados no Alcorão, ainda que ele não seja citado pelo nome.

Após a morte do Profeta Muhammad, Abu Bakr se tornou o primeiro califa do Islam. Seu governo foi fundamental para reprimir as revoltas dos apóstatas e garantir o bem estar social da comunidade islâmica. Ele também foi o primeiro a compilar o Alcorão escrito, garantindo a coesão da doutrina islâmica e a difusão da religião.

Fonte

-LINGS, Martin. Muhammad – a vida do Profeta do Islam segundo as fontes mais antigas. São Paulo: Attar Editorial, 2010

-HASAN, Professor Masud-ul. Hadrat Abu Bakr, Umar, Usman, Ali (ra). Lahore: Islamic Publications, 1982.

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