Analisamos o pedido nº. 980 para o ano de 2009 apresentado em 28 de maio de 2009, que inclui o seguinte:
Recentemente, várias seitas e grupos fizeram diversas publicações afirmando a permissibilidade do uso de armas de destruição em massa contra países não islâmicos, alegando que suas afirmações estão em conformidade com a lei islâmica. Eles substanciam suas alegações com provas de alguns textos jurídicos e em analogia com turs [escudo humano], tabyit [surpreendendo o inimigo a noite] e tahriq [matando com fogo] mencionado em alguns livros de jurisprudência islâmica.
Este argumento está correto e está de acordo com a lei islâmica?
“Armas de destruição em massa” (ADM) é um termo militar usado para designar uma classe de armas não convencionais altamente destrutivas, capazes de causar danos em grande escala às criaturas vivas e ao meio ambiente.
As ADMs são classificadas em três categorias:
1- Armas atômicas: incluem a bomba nuclear, a bomba de hidrogênio e a bomba de nêutrons. Armas nesta categoria são projetadas para difundir radiação que é destrutiva para humanos e edifícios e poluir cidades inteiras por longos períodos. Algumas dessas armas podem destruir apenas humanos.
2- Armas químicas: incluem gases polivalentes, usados em operações militares, e agentes de combustão. As armas químicas são extremamente perigosas, potencialmente fatais para qualquer criatura viva exposta a elas e destroem a vegetação. Os agentes de guerra química comumente ocorrem em um estado líquido gasoso ou altamente vaporoso e são extremamente tóxicos. Raramente existem em um estado sólido.
3- Armas biológicas: este é um termo aplicado às bactérias e vírus usados para espalhar doenças epidêmicas perigosas atrás das linhas inimigas, causando perdas aos seus suprimentos animais e agrícolas.
Possuir esses tipos de armas para dissuadir os inimigos é um requisito da lei islâmica. Isso é evidenciado pelas palavras de Allah:
“E aprontai quantas forças puderdes, e mantende os cavalos preparados para aterrorizar o inimigo de Allah e vosso inimigo” Surah Al Anfal, 60.
Em sua interpretação do versículo, al Alusi disse: "Qualquer coisa que possa ser usada como dissuasão na guerra" [24/10 Dar al Turath al Arabi]. No versículo anterior, Allah ordena aos muçulmanos que detenham seus inimigos que podem estar inclinados a atacar os muçulmanos. Além de ser um princípio da lei islâmica que inclui punições e ações disciplinares, a dissuasão também é um princípio político legítimo sancionado pelos Estados em suas políticas de defesa e estabelecido em estratégias militares.
Adquirir e possuir ADMs é parte integrante dos requisitos legais e políticos [religiosos]. Isso ocorre porque uma condição para um requisito é [naturalmente] um requisito e a licença para realizar uma determinada ação autoriza a implementação das condições de seus objetivos.
É bem sabido que adquirir e possuir armas de destruição em massa cria um equilíbrio estratégico e militar entre os estados e serve para dissuadir qualquer estado que seja tentado a lançar um ataque hostil contra um país muçulmano, evitando, assim, que sejam arrastados para uma guerra indesejada. Isso se aplica à aquisição de armas de destruição em massa e ao seu uso para deter inimigos e opressores. Existe uma diferença entre adquirir essas armas para deter potenciais agressores e iniciar seu uso.
O cenário de início do uso de armas de destruição em massa, baseado no raciocínio pessoal e nas opiniões de seitas, facções e grupos individuais, é proibido pela lei islâmica. Qualquer opinião que mantenha sua permissibilidade ou a atribua à lei islâmica e seus estudiosos é uma falsa alegação e acusação contra a lei e a religião [sagradas]. Isso é comprovado pelo seguinte:
É imperativo que a decisão de declarar guerra seja baseada em seu próprio raciocínio e seus súditos devem obedecê-lo. Um governante está autorizado a declarar guerra devido ao seu conhecimento de questões evidentes e ocultas, das consequências das ações e do interesse de seu povo. Por esta razão, um governante está autorizado a declarar guerras e celebrar tratados nacionais ou internacionais assim que assumir o cargo. Por sua vez, ele não emite decisões baseadas em caprichos [pessoais]. Ele declara guerra somente após consultar especialistas em todos os campos relevantes, como especialistas técnicos, militares e consultores políticos, que são indispensáveis na estratégia militar.
Pessoas que determinam independentemente o uso de armas de destruição em massa não apenas impõem sua opinião aos governantes, mas a toda a comunidade [muçulmana]. Eles se dão o direito de tomar decisões relacionadas ao destino de toda a comunidade, sem recorrer a ahl al hall wal aqd [Pt. aqueles que estão qualificados para eleger ou destituir um governante em nome da comunidade muçulmana] em questões que expõem o país ou o povo a grandes perigos.
O erudito al Bahuti disse, em Sharh Muntaha al Iradat: “É proibido [lançar um] ataque sem a permissão do governante porque ele é responsável por tomar a decisão de declarar guerra. [Isso porque] ele tem acesso a todas as informações relativas ao inimigo. [Sua permissão é obrigatória], exceto se [os muçulmanos] forem pegos de surpresa por inimigos não muçulmanos e temerem sua ameaça. [Somente] então é permitido lutar contra os atacantes sem a permissão do governante por causa do benefício geral nisso”.
Os Estados islâmicos devem respeitar os acordos e tratados que reconheceram e celebraram por conta própria, permanecer firmemente ao lado da comunidade internacional para alcançar a paz e segurança globais [somente] na medida do compromisso dos países signatários. Allah diz:
“Ó vós que credem, honrai vossos compromissos” Al-Maida 5:1
No versículo acima, o termo “compromissos” se refere a todos entre as duas partes de uma ação específica. Em sua interpretação do versículo acima, o erudito tunisiano ibn Ashur diz: "Os contratos [compromissos] neste versículo referem-se a um gênero que denota a totalidade [dos contratos]. Inclui os convênios que os muçulmanos fizeram com seu Senhor, de modo a seguir a sharia (...), pactos de lealdade entre os crentes e o profeta de não associar parceiros a Allah, roubar ou cometer fornicação (...), acordos entre muçulmanos e não muçulmanos (...) e acordos entre um muçulmano e outro” [Al Tahriir wa al Tanwir, 6/74].
Amr ibn Awf al Muznai narra que o profeta disse: "Os muçulmanos estão sujeitos às condições [que estipulam], exceto aquelas que são ilegais ou aquelas que tornam as questões ilegais legais" [relatado por al Tirmidhi].
Comentando sobre este hadith, al Jassas disse: "É uma obrigação geral cumprir todas as condições às quais o homem se sujeite, desde que não haja nada (na lei islâmica) para restringi-las" [Ahkam al Quran, 2 / 418].
Ali narrou que o profeta disse: "A proteção concedida pelo muçulmano mais fraco a um não-muçulmano é equivalente à de toda a [comunidade]. Quem a violar incorre na maldição de Allah, os anjos e todas as pessoas” [Relatado por al Bukhari].
Abdullah ibn Umar narrou que o profeta disse: "Os sinais da hipocrisia são quatro: quando lhe é confiado algo e ele trai a confiança, quando ele fala e ele mente, quando ele faz uma promessa e a quebra, quando briga e se comporta de maneira imoral. Quem possui todos os quatro é hipócrita e quem possui um deles, possui um elemento de hipocrisia até que a abandone.” [Relatado por al Bukhari em seu Sahih].
Umar ibn al Hamq al Khazai narrou que o Profeta disse: "Se um homem confia sua vida a outro e é morto por ele, não tenho nada a ver com o assassino, mesmo se o homem assassinado não fosse um Muçulmano” [Relatado por al Bayhaqi].
Consequentemente, as partes dos tratados e acordos internacionais se comprometem a pôr fim à guerra e a gozar de um estado de paz em virtude do acordo que firmaram. Allah Todo-Poderoso diz:
“Se eles se inclinarem para a paz, inclina-te para ela também e confia em Deus. Ele ouve tudo e sabe tudo.” (Al Anfal, 61)
Abu Hurairra narrou que o Mensageiro de Allah disse: "Um crente não deve matar [os outros]. A fé é um impedimento para matar". Ibn al Athir disse: "Matar [aqui] significa pegar outros de surpresa e matá-los enquanto eles não estão preparados" [Al Nihaya fi Gharib al Hadith wa al Athar 3/775].
O hadith significa que a fé é um impedimento para atacar os outros repentinamente, enquanto não estão preparados. As palavras do Profeta: "O crente não deve atacar [os outros] de surpresa" são uma proibição clara, pois envolvem engano.
Khubayb al Ansari foi capturado pelos politeístas e vendido em Meca para Bani al Harith ibn Amir ibn Nawfal ibn abd Manaf. Foi Khubayb quem matou al-Harith ibn Amir na batalha de Badr. Ele permaneceu prisioneiro com eles por algum tempo. Certa vez, ele pediu à filha de al-Harith uma navalha para fazer a barba e colocou o filho dela no colo. Quando ela viu esta cena de Khubayb segurando a navalha na mão e o filho no colo, ficou com medo. Em seguida, Khubayb disse a ela: "Você tem medo de que eu possa matá-lo? Eu nunca farei isso." Ela disse: "Nunca vi um prisioneiro melhor do que Khubayb”.
Este é um exemplo de um muçulmano preso por seus inimigos que conspiraram para matá-lo. Apesar de estar à beira da morte, ele se absteve de matar seu filho quando teve a oportunidade de fazê-lo. As maneiras de um muçulmano são isentas de engano e de matar outros de surpresa.
Al Bukhari e Muslim relataram por meio de Abdullah ibn Umar que uma mulher foi encontrada morta em uma das batalhas travadas pelo Profeta. Em seguida, ele condenou matar mulheres e crianças. Outra frase do hadith afirma: "O Mensageiro de Allah proibiu matar mulheres e crianças". O Imam al Nawawi disse: "Há um consenso acadêmico em colocar este hadith em prática, desde que as mulheres e crianças não lutem [contra os muçulmanos]. Se o fizerem, a maioria dos acadêmicos afirma que eles deveriam ser mortos" [Sharh Muslim 12/48].
Visar outros países com armas de destruição em massa colocará em risco a vida de muçulmanos residentes, nativos ou visitantes. A nobre Shariah honra a vida dos muçulmanos e adverte contra o derramamento de seu sangue sem direito. Allah Todo-Poderoso diz:
“Quem matar um crente com premeditação, seu castigo será a Geena, onde permanecerá para todo o sempre, e a cólera de Deus, e a Sua maldição, e um terrível suplício.” (Al Nisa, 93)
“Por isso, prescrevemos aos filhos de Israel que quem matar um homem, a não ser pela lei de talião ou porque corrompia a terra, é como se tivesse matado todos os homens; e quem salvar a vida de um homem, é como se tivesse salvo a vida de todos os homens.” (Al Maida, 32)
Abdullah ibn Amr narrou que o Profeta disse: "O perecimento deste mundo é mais fácil aos olhos de Allah do que tirar a vida de um muçulmano" [Sunan al Nassai].
Ibn Umar disse: "Eu vi o mensageiro de Allah circulando a Caaba dizendo: “Quão grande e sagrada você é, e quão agradável sua fragrância! Por Aquele em cujas mãos está a vida de Muhammad, a santidade de um crente, sua propriedade, sua vida e o pensar bem dele é maior aos olhos de Allah do que o seu” [Ibn Majah].
Matar um muçulmano intencionalmente e apesar de tudo é o maior pecado que vem depois da descrença. Os Companheiros do Profeta e seus alunos divergem sobre a aceitação de Allah do arrependimento do assassino.
Um ato tão tolo trará catástrofes não apenas para os muçulmanos, mas para todo o mundo, porque os países sob ataque podem retaliar na mesma moeda ou de maneira mais brutal. Além disso, os efeitos destrutivos de algumas dessas armas podem exceder a área visada e se espalhar pelo vento para outros países não envolvidos no conflito. Consequentemente, os males imediatos e de longo alcance das ADMs são maiores do que os benefícios, se estes existirem. Vale a pena mencionar, neste ponto, que prevenir danos está entre os princípios da lei islâmica. Isso é baseado na máxima legal, "Prevenir danos tem precedência sobre obter benefícios".
Algumas dessas armas danificam propriedades individuais e públicas, desperdiçando riquezas, o que é proibido pela lei islâmica. A proibição é maior se a riqueza desperdiçada pertencer aos oprimidos. Portanto, essa proibição consiste em violar a lei islâmica, por um lado, e os direitos dos outros, por outro.
O uso de alguma dessas armas pode obrigar o agressor a entrar no alvo. A permissão para entrar em um país é considerada um acordo de segurança não verbal para não causar corrupção no país anfitrião.
O Imam al Khurqi disse em seu Mukhtasr: "Quem quer que entre em segurança em terras inimigas não tem permissão para roubar seu dinheiro."
Comentando esta declaração, Ibn Qudama disse que é proibido traí-los [não-muçulmanos em países não-muçulmanos] porque existe um pacto tácito para entrar em segurança, com a condição de que a pessoa que pede permissão para entrar em um país estrangeiro o faça sem traí-lo ou oprimi-lo. Portanto, quem entra em nossas terras em segurança e nos trai, viola este acordo de segurança. Isso é proibido porque envolve traição, o que é proibido em nossa religião”. [Al Mughnni 9/237].
Os textos legais e jurídicos usados como prova para difundir esta ideia extrema são retirados de contexto. O uso desses textos dessa maneira perturba a paz, ignorando as diferenças entre os estados de guerra e de paz e as regras especiais relativas a cada um deles. Esta é uma diferença convincente que é inconsistente com o uso de ADMs com base em evidências textuais sobre a permissibilidade de tabit e ramy al turs. É um grave erro fazer essa analogia, ainda que sejam válidas em si mesmas no contexto citado pelos autores desses textos. É perigoso tirar essas decisões de seu contexto e aplicá-las a diferentes situações.
Além disso, é inadmissível derivar uma decisão permitindo o uso de ADMs contra um opressor com base na analogia, uma vez que está estabelecido que há uma diferença entre as decisões para repelir um agressor e as da jihad [luta pela causa de Allah]. Isso inclui repelir o agressor pelos meios menos violentos. Se for possível resolver o conflito de forma pacífica, é proibido o uso de armas contra o agressor. Usar armas de destruição em massa contra outras pessoas não é consistente com os valores islâmicos.
É inválido basear a permissibilidade de usar ADMs em analogia [Ar qiyas] para tabyit, usando a catapulta, ou tahriq pelas seguintes razões:
- Existem diferenças grandes e evidentes entre as duas situações.
- As tradições proféticas mencionadas em tahriq, tabyin e o uso da catapulta foram narradas em um estado de guerra; há uma diferença entre um estado de guerra e paz.
- Há uma grande diferença nos efeitos de atirar pedras no inimigo usando a catapulta e entre usar ADMs. Os efeitos da catapulta são relativamente restritos em comparação com os efeitos das ADMs.
- Os métodos de guerra acima mencionados nas tradições proféticas foram conduzidos com a aprovação dos governantes. Dar a uma pessoa [que não seja um governante] o direito de declarar guerra é um crime contra a comunidade [islâmica] e seus governantes sob o pretexto da jihad.
Mesmo se assumirmos a autenticidade dessas tradições proféticas, devemos notar que elas se referem a incidentes específicos e não podem ser colocadas em prática de forma geral. Por esta razão, alguns estudiosos sustentam que o princípio [na guerra] é evitar tabyit, tahriq e destruição; eles baseiam sua opinião nos textos religiosos gerais que discutem a ética da guerra.
Nossa opinião é que as armas de destruição em massa que causam incêndios não devem ser utilizadas devido à proibição de queima. Depois de ordenar que suas tropas usassem fogo, o profeta proibiu sua implementação como arma, embora os muçulmanos estivessem em estado de guerra. Abu Hurayrah narrou que o Profeta disse: "Somente Allah tem o direito de punir com fogo" [Bukhari]. É sabido que muitas armas de destruição em massa causam grandes incêndios, por isso é melhor proibir seu uso, mesmo em estado de guerra.
É um erro basear a questão do uso de ADMs em tabyit porque os estudiosos restringiram sua permissibilidade ao seguinte:
- Deve ser implementado em estado de guerra.
- O inimigo deve ser aquele com quem os muçulmanos têm permissão de lutar, em comparação com o inimigo com quem os muçulmanos têm uma trégua. É inadmissível atacar o inimigo sob o escuridão da noite, porque é uma violação do pacto de segurança entre eles em termos de vidas, riqueza e honra.
Se é proibido atacar na escuridão o inimigo com o qual os muçulmanos têm um pacto de segurança, então é ainda pior usar tais armas letais contra eles.
Não é permitido o uso de escudos humanos, exceto em estado de guerra e sob condições específicas detalhadas por juristas. [Bahr Raiq 80 \ 5, Hashiyat ibn Abi Din 223 \ 3, Rawdat al Tablibin 239 \ 10, Mughni al Muhtaj 223 \ 4, Mughni ibn Qudama 449 \ 8, 386/10].
Com base no exposto, o que foi mencionado na pergunta é uma afirmação falsa. É um grande crime promover essa afirmação, pois também é considerada corrupção na terra, o que Allah Todo-Poderoso proíbe. Seus perpetradores são avisados de punições severas:
“Se os hipócritas e aqueles em cujos corações há doenças e aqueles que espalham rumores em Medina não cessarem, nós certamente o incitaremos contra eles; então eles não permanecerão seus vizinhos ali, senão por pouco tempo.” (Al-Ahzab 60)
“Sede honestos na medida e no peso, não leseis os outros e não corrompais a terra uma vez pacificada: assim será melhor para vós, se sois crentes.” (Al Araf 85)
“Então, talvez, se você se afastasse, causaria corrupção na terra e cortaria seus [laços de] parentesco? Aqueles [que fazem isso] são aqueles que Allah amaldiçoou, então Ele os ensurdeceu e cegou sua visão” [Muhammad̄] 22-3.
Allah Todo-Poderoso sabe melhor.
Fonte: Dar Al-Ifta Al-Missriyyah
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