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A Liberdade Religiosa Garantida na Revelação Islâmica

  • A liberdade religiosa é algo que foi estabelecido pelo Alcorão e também nos relatos de vida do Profeta Muhammad.
  • Desde a sua primeira constituição, o Islam estabeleceu aos não-muçulmanos o direito de seguir sua cultura e religião.
  • Esses exemplos foram replicados ao longo da história islâmica dentro dos principais impérios que governaram sobre as leis da religião.
  • Atos terroristas e extremistas não ocorrem devido a um cumprimento rígido da lei islâmica, mas sim do desvio dela.

A ação de grupos fanáticos e terroristas ao longo da segunda metade do século XX e princípio do século XXI fez com que muitas pessoas acreditassem que o Islam é uma religião intolerante que não respeita a pluralidade religiosa. Essa realidade, no entanto, não poderia estar mais distante daquilo que foi revelado pelo Alcorão, que defende abertamente o direito de haver outras religiões em domínios islâmicos.

Se, por um lado, os extremistas dos últimos 40 anos se mostraram intolerantes às outras crenças, por outro, a história revela a presença de inúmeras religiões em todo o mundo islâmico, que estão em locais como o Oriente Médio, Sul da Ásia, Norte e Oeste da África desde o surgimento de cada uma delas, mostrando que a pluralidade sempre fez parte da religião, mesmo em épocas em que isso não era regra no mundo todo.

Os não-muçulmanos de origem monoteísta foram referidos no Alcorão como “Povo do Livro” (Ahl al-Kitab). Mais tarde, os habitantes não-muçulmanos dos estados islâmicos foram reconhecidos como dhimmis, ou o “povo da aliança”. Embora houvesse leis específicas para membros de outras religiões, eles também tinham direitos exclusivos e liberdades que os muçulmanos não tinham.

O Povo do Livro no Alcorão

É parte da doutrina islâmica crer que Allah enviou outros profetas e livros sagrados para todos os povos. No entanto, essas revelações acabaram sendo adulteradas pelos homens, fazendo com que surgissem diferentes religiões. O Alcorão menciona as principais entre elas, que são as maiores religiões monoteístas: cristãos, judeus e sabeus. 

“Os crentes, os judeus, os cristãos e os sabeus, enfim todos os que crêem em Allah, no Dia do Juízo Final, e praticam o bem, receberão a sua recompensa do seu Senhor e não serão presas do temor, nem se angustiarão.” (Alcorão 2:62)

O Alcorão não obriga que adeptos de outras religiões se convertam ao Islam para viver sob a proteção de um governo islâmico.

“Não há imposição quanto à religião, porque já se destacou a verdade do erro. Quem renegar o sedutor e crer em Allah, ter-se-á apegado a um firme e inquebrantável sustentáculo, porque Allah é Oniouvinte, Sapientíssimo.” (Alcorão 2:256)

“Dize: Ó incrédulos, Não adoro o que adorais, Nem vós adorais o que adoro. Nem adorarei o que adorais, Nem vós adorareis o que adoro. Vós tendes a vossa religião e eu tenho a minha.” (Alcorão 109)

Esses e outros versículos deixam claro que uma sociedade islâmica admite a pluralidade religiosa, sobretudo de religiões que, na visão do Islam, carregam uma parte da verdade em sua doutrina.

Relatos do Profeta

Os relatos da vida do Profeta Muhammad são fontes que explicam na prática aquilo que o Alcorão estabeleceu como norma. O Mensageiro de Allah disse aos seus seguidores que devem proteger as pessoas de outras religiões que possuem a aliança com os muçulmanos.

“O Profeta disse: "Quem quer que mate um Muahid (uma pessoa a quem foi concedida a promessa de proteção dos muçulmanos) não deve cheirar a fragrância do Paraíso, embora sua fragrância possa ser sentida a uma distância de quarenta anos (de viagem).” (Sahih al-Bukhari 6914)

“A proteção concedida pelos muçulmanos é única e deve ser respeitada pelo mais humilde deles. E aquele que quebrou o pacto feito por um muçulmano, há uma maldição de Allah, dos seus anjos e de todo o povo sobre ele, e nem um ato obrigatório nem um ato supererrogatório seriam aceitos dele como recompensa no Dia da Ressurreição." (Sahih Muslim 3167)

Portanto, é parte do comportamento profético e dos mandamentos de Allah aceitar as pessoas de outras religiões que estejam sob a proteção de um estado islâmico.

Constituição de Medina

Na prática, a Constituição de Medina foi a primeira vez que a sharia, a lei islâmica, foi institucionalizada. Nela, a proteção dos não-muçulmanos é mencionada algumas vezes, pois na cidade havia presença de algumas tribos judaicas e politeístas também.

“15§. A proteção (aos dhimmis) de Allah é uma, o menor deles (isto é, os muçulmanos) tem o direito de conceder proteção (yujir) que é obrigatória para todos eles. Os crentes são aliados uns dos outros (mawali) com exclusão de outras pessoas.”

“16§. Os judeus que se juntam a nós como clientes (man tabi ana min yahud) receberão ajuda e paridade (ou favor); eles não serão prejudicados, nem seus inimigos serão ajudados contra eles.”

“25-31§. Os judeus (o nome de cada tribo de Medina é mencionada nos parágrafos seguintes) são uma comunidade (protegida) dos crentes; os judeus têm sua religião (din) e os muçulmanos têm a deles. Isso se aplica a seus clientes (mawalihim) e a eles próprios. Mas quem faz o mal ou comete a traição só traz o mal para si e para sua família.”

“37§. As (partes deste tratado) ajudarão uns aos outros contra quem quer que esteja em guerra com o povo deste documento. Entre eles está boa vontade e sinceridade. E a justiça é mais fácil do que o pecado. Um homem não agirá injustamente com seu cliente (halif), e qualquer pessoa injustiçada será ajudada.”

Outros acordos 

O Profeta Muhammad também jurou proteger cidadãos cristãos. Um documento revela que ele entrou em contato com pessoas do mosteiro de Santa Catarina, na região do Sinai, em que ele disse: 

“Ninguém destruirá a casa de sua religião, para a danificar, ou para tomar qualquer coisa, para casa de muçulmanos. Se alguém procedesse desta forma, ele iria estragar a aliança de Deus e desobedecer ao Seu Profeta.”

Você pode conferir o documento completo clicando aqui.

Mais tarde, o exemplo do Profeta foi seguido pelo seu nobre companheiro Omar ibn al-Khattab, o segundo califa dos muçulmanos, que ao derrotar e dominar as terras dos cristãos da tribo dos Gassânidas na Síria, assegurou que eles não seriam obrigados a se converter ao Islam, poderiam seguir seus próprios líderes e normas religiosas e suas crianças não poderiam ser forçadas a aprender o Alcorão. Posteriormente, isso se estendeu a zoroastras e judeus.

Exemplos de Tolerância na História

O Islam se espalhou massivamente por três continentes durante aproximadamente 1400 anos. De Portugal até a China, de Moçambique até a Rússia, há registros de sociedades islâmicas vibrantes em algum momento da história, de forma que é impossível resumir todas as relações com povos de outras religiões: basta dizer que em alguns momentos eles foram respeitados e em outros, não.

No entanto, é possível analisar algo em comum nos países que, em algum momento, pertenceram a algum dos principais impérios islâmicos da história, isto é: os Impérios Omíada, Abássida, Otomano, Mogol, Seljúcida, etc. Todos eles possuíam e alguns ainda possuem uma grande presença de outros grupos religiosos.

Entre alguns exemplos, podemos citar que cerca de 20% da população de Al-Andalus se dividia entre cristãos e judeus no século X. Nessa época, havia uma pluralidade de ritos cristãos que não existia nos países católicos, enquanto os judeus viveram um período de intensa produção intelectual, marcando um período que os historiadores atuais chamam de a “era de ouro do judaísmo”.

Apenas 15% da população do Império Mogol era muçulmana durante o século XVIII, embora o estado fosse liderado por governantes muçulmanos. Mesmo os hindus não sendo considerados um dos povos do livro, os juristas islâmicos verificaram que a raíz da religião da maioria dos indianos era monoteísta, o que lhes deu o direito de serem protegidos pelo estado segundo a lei corânica, que também se estendeu posteriormente para budistas e jainistas. 

Da mesma forma, sempre houve massiva pluralidade religiosa no Oriente Médio e, mesmo com o declínio de algumas populações causadas por fanáticos religiosos e êxodo causado pela independência de países não-muçulmanos (como no caso da Grécia, Armênia e Israel), estima-se que ainda hajam cerca de 13-16 milhões de não-muçulmanos na região, sendo que a maioria é cristã. Até hoje existem templos milenares de diversas religiões naquela região.

Embora tenha havido embates indesejados entre muçulmanos e não-muçulmanos e até mesmo episódios de crueldade, não é possível alegar que a religião islâmica é naturalmente intolerante, nem que a tolerância não foi defendida pelos principais governos religiosos ao longo da história. Isso revela que o terrorismo e o radicalismo não são obras de pessoas que seguem a religião à risca, e sim daquelas que se desviaram dela e ignoram seus princípios.

Conclusão

Desde a sua revelação, o Islam prevê liberdade religiosa. O Alcorão determinou que os fiéis de religiões monoteístas são considerados o Povo do Livro e, em seguida, o Profeta Muhammad estabeleceu a primeira constituição de um estado islâmico, onde povos de diferentes culturas e credos poderiam viver de acordo com os seus próprios costumes.

A forma como Deus concedeu a liberdade para seguidores de outras religiões e a maneira como o Profeta Muhammad concedeu o direito a pluralidade dentro da constituição islâmica foi replicada por vários impérios ao longo da história, e graças a isso, religiões milenares foram conservadas dentro de domínios islâmicos.

Infelizmente, mesmo após as regras de boa convivência inter-religiosas serem estabelecidas, houve episódios em que os muçulmanos não respeitaram aquilo que foi determinado como regra para eles. No entanto, o fanatismo e o terrorismo não são um cumprimento estrito das leis religiosas, e sim um desvio delas.

Fonte

https://yaqeeninstitute.org/read/paper/the-constitution-of-medina-translation-commentary-and-meaning-today

https://yaqeeninstitute.org/read/paper/religious-minorities-under-muslim-rule

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