Hoje, o Mali é conhecido como um dos países mais pobres do planeta. A expectativa de vida e as taxas de alfabetização estão perigosamente baixas. A rebelião étnica violenta dos Tauregs no Norte do país que ameaça dividir o país ao meio tem sido uma das poucas coisas que trouxeram o Mali à notícia recentemente. Mas a vida no Mali nem sempre foi esta negativa e deprimente. Uma vez, o Mali foi o brilhante exemplo de um estado muçulmano bem-sucedido. Foi invejado pelas pessoas ao redor do mundo. Foi realmente uma mina de ouro no deserto.
A região conhecida como Mali está localizado nas extremidades do sul do Deserto do Saara. Aqui há uma região de transição entre os desertos áridos e estéreis para o norte e as florestas tropicais ao longo da costa para o sul. Isto é conhecido como o Sahel.
O que falta no Mali de terras férteis, foi compensado com recursos valiosos. As minas de ouro e sal foram o epicentro da economia do Mali por centenas de anos. As rotas de comércio estenderam-se do norte do Mali para a costa norte-Africana, onde os comerciantes ricos pagariam preços elevados pelo o ouro e sal para enviarem para a Europa e sudoeste da Ásia. Estas rotas de comércio fez os mandingas (o principal grupo étnico da África Ocidental) incrivelmente rico.
As mercadorias não eram as únicas coisas negociadas através dessas rotas. Idéias fluiram de norte a sul. Comerciantes muçulmanos levavam o Islam com eles, juntamente com o ouro e sal. A partir dos anos 700 em diante, o Islam lentamente começou a se enraizar entre as pessoas no Sahel do Oeste Africano. A princípio, a resposta dos estados não-muçulmanos da África Ocidental era suprimir o Islam ou pelo menos separar os muçulmanos da população em geral. No entanto, à medida que mais e mais pessoas começaram a aceitar o Islam, estados muçulmanos começaram a surgir.
Um estado muçulmano, Mali, foi fundado por uma figura obscura chamada Sundiata Keita. A lenda épica de sua vida já viajou ao longo dos séculos como uma história oral, e, assim, a verdade de sua história foi distorcida ao longo do tempo (em uma anedota, ele, sozinho, desenraizava uma árvore totalmente crescida, e replantava-as no quintal de sua mãe). O que sabemos é que ele fundou o Império Mali e criou um papel para a população muçulmana emergente da África Ocidental, em 1230. Ele levou o título de “Mansa”, a palavra mandinga para rei.
A décima mansa do Mali foi Musa I, que governou de 1312 a 1377. Ele chegou ao poder quando seu irmão, Mansa Abu Bakr, liderou uma expedição através do Oceano Atlântico para descobrir as Américas, deixando Musa no trono. Muito do que sabemos sobre o reinado de Musa vem da história épica do seu Hajj, em 1324.
Como um muçulmano devoto, Mansa Musa insistiu sobre a realização do quinto pilar do Islam, o Hajj à Meca. O isolamento geográfico do Mali fez a viagem muito difícil e impossível para a maioria das pessoas, mesmo no mundo de hoje, com transporte moderno. No entanto, em 1324 Musa partiu do Mali com uma comitiva de 60 mil pessoas.
Sendo o seu império um dos mais ricos do mundo, a caravana de viajantes deve ter causado uma grande impressão à todos que passavam. 12.000 funcionários acompanharam, cada um usando sedas valiosas e carregando uma barra de 4 libras de ouro. 80 camelos carregavam entre 50 e 300 quilos de pó de ouro cada, que foi dado aos pobres ao longo da rota. Animais exóticos e pessoas de todas as esferas da vida ajudaram a fazer esta viagem um épico que deixou uma impressão em todos que o viram. Numerosos relatos de diferentes regiões atestam a grandiosidade desta procissão.
Mansa Musa fez uma parada no Egito em seu caminho para Meca. Enquanto estava lá, ele inicialmente se recusou a atender o sultão mameluco do Egito, porque a tradição era de se curvar ao sultão. Musa insistiu que ele só se inclina para Allah. Ele fez uma forte impressão sobre o governo Mameluco, pois os funcionários notaram que ele conhecia o Alcorão e era muito afinco sobre a oração na hora. Musa foi claramente um muçulmano muito devoto.
Enquanto no Egito, a incrível quantidade de riqueza de Musa levaram à algumas consequências inesperadas. Ele distribuiu presentes de ouro para os membros do governo, os pobres, acadêmicos e muitos outros. Devido às leis da oferta e da procura, o preço do ouro no Egito despencaram, efetivamente paralisando a economia. Mesmo uma década mais tarde, durante a visita de Ibn Battuta ao Cairo, ele observou que a economia ainda não estava completamente recuperada da visita de Mansa Musa. O efeito que a visita de Mansa Musa tinha sobre o Egito mostra claramente a riqueza e importância do Império Mali, mesmo quando ele encontrou distantes terras.
No caminho de volta para sua terra natal após o Hajj, Mansa Musa insistiu em trazer os muçulmanos mais inteligentes e talentosos para o seu reino. Com sua imensa riqueza, ele pagou estudiosos, artistas, professores, arquitetos, e pessoas de todas as profissões para virem para o Mali e contribuirem para o crescimento do Islam lá. Grandes pessoas foram trazidos para Mali do Egito, Síria, Iraque, al-Andalus, e o Hejaz.
O efeito que isso teve sobre Mali foi imenso. Arquitetonicamente, os edifícios no Mali começaram a mostrar uma mistura de design espanhol, árabe e persa. Esta mistura única de culturas criou um estilo Africano distintamente ocidental que ainda é visto em sua arquitetura. A lendária cidade de Timbuktu foi especialmente abençoada pelo Hajj de Mansa Musa, com muitas mesquitas, como a Masjid Sankore sendo construída pelos melhores arquitetos do mundo. Mansa Musa até pagou o arquiteto andaluz Ibn Ishaq 200 quilogramas de ouro para construir a Mesquita Sankore em Timbuktu. Ser capaz de pagar os melhores arquitetos, acadêmicos e professores fizeram o Mali, e Timbuktu, em geral, um centro de conhecimento islâmico.
O impacto mais significativo que o Hajj de Musa teve no Mali foi seu subseqüente crescimento como um centro de conhecimento. Com os melhores estudiosos de todo o mundo muçulmano, o Mali desenvolveu uma das mais ricas tradições educacionais do mundo naquela época. Bibliotecas estavam por todas as cidades como Gao e Timbuktu. Colecções públicas e privadas tinham milhares de livros sobre temas de fiqh islâmica, astronomia, língua e história. Grandes universidades atraíram estudantes talentosos de toda a África para virem estudar neste centro de conhecimento.
Esta tradição de conhecimento dura até hoje no Mali. As famílias ainda possuem coleções de bibliotecas privadas que chegam a centenas de livros, muitos deles com centenas de anos. O povo do Mali são ferozmente protetores de seu conhecimento, que foi passado a partir do tempo de Mansa Musa, o que torna muito difícil para pessoas de fora acessarem estes grandes bibliotecas.
Estes manuscritos hoje estão ameaçados pela desertificação do Sahel, onde o meio ambiente ameaça transformar estes grandes livros em pó. Problemas políticos na África Ocidental também ameaçam destruir os manuscritos remanescentes. Estão em curso esforços para preservarem estas grandes bibliotecas digitalizando-as. A Fundação Educacional Timbuktu está liderando os esforços para digitalizar páginas individuais antes que eles sejam perdidos. Você pode encontrar (e ler) muitos destes manuscritos online.
Na medida em que o Mali tornou-se um centro de conhecimento na África Ocidental, o Islam foi arraigando profundamente na vida de seu povo. Era comum para “pessoas comuns” serem muito bem educadas na religião e em assuntos seculares. Os efeitos desse conhecimento sobre a sociedade é visto em a viagem de Ibn Battuta ao Mali na década de 1350, quando ele observou que se um homem queria ter um assento na mesquita durante a oração de sexta-feira, ele teria que enviar horas antes seu filho para reservar um local para ele, pois as mesquitas estariam cheias até a borda no início da manhã.
A importância do Mali e suas contribuições para o mundo não podem ser exageradas. Em sua história, foi um dos centros de conhecimento islâmico e riqueza. Sua importância para o mundo diminuiu ao longo dos séculos 16 ao 18 até que foi colonizada pelos franceses em 1800. Esta história não está perdida para sempre, no entanto. Ela vive na experiência contínua de muçulmanos da África Ocidental, e do legado que deixou sobre o resto do mundo.
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Fonte: https://lostislamichistory.com/a-gold-mine-in-the-desert-the-story-of-mali/
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