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Uma explicação sobre o polêmico Hadith de Najd

É impactante que nenhum dos grandes muhaddiths, mufassirs, gramáticos, historiadores ou legistas do Islã tenha emergido da região conhecida como Najd, a despeito da profusão extraordinária e abençoada de tais pessoas em outras terras islâmicas. Esta dissertação oferece aos muçulmanos com mentes abertas uma explicação de tal fato notável.

O Hadîth do Najd: uma correção
A terra do Najd, que por dois séculos tem sido o núcleo da doutrina wahhâbi, é o assunto de um corpus de ahâdîth interessantes e antigas narrações que instigam a uma análise mais de perto. Entre os mais conhecidos desses ahâdîth está a relato do Imâm al-Bukhâri na qual Ibn ‘Umar disse: “O Profeta (s.a.w.s.) mencionou: ‘Ó Allah, dê-nos baraka na nossa Síria; ó Allah, dê-nos baraka no nosso Iêmen.’ Eles disseram: ‘E o nosso Najd?’ e ele disse: ‘Ó Allah, dê-nos baraka na nossa Síria; ó Allah, dê-nos baraka no nosso Iêmen.’ Eles disseram: ‘E o nosso Najd?’, e creio que ele disse na terceira vez: ‘Naquele lugar há terremotos e sedições, e naquele lugar se erguerá o chifre do diabo [qarn al-shaitân].”’

Esse hadîth é claramente impalatável para os próprios najditas, alguns deles dos quais até hoje se empenham em persuadir os muçulmanos de distritos com melhor reputação que o hadîth não significa o que diz claramente. Um recurso usado por tais apologistas é utilizar a definição que inclui o Iraque nas fronteiras do Najd. Com essa manobra, os najditas sacam a conclusão de que a parte do Najd que é condenada tão fortemente no hadîth é de fato no Iraque, e que o Najd mesmo está excluído. Geógrafos medievais islâmicos contestam essa tese inerentemente estranha (veja por exemplo Ibn Khurradadhbih, al-Masâlik wa’l-Mamâlik [Leiden, 1887], 125; Ibn Hauqal, Kitâb Sûrat al-’Ard [Beirute, 1968],18); e limitam a extensão norte do Najd em Wadi’ al-Rumma, ou nos desertos ao sul de Mada’in. Não há indicação de que os lugares nos quais a segunda onda de sedição se elevou, como Kûfa e Basra, foram associados na mente dos primeiros muçulmanos com o termo “Najd”. Pelo contrário, esses lugares são em todo caso identificados como localizados na terra do Iraque.

A evasão desse entendimento prévio do termo para excluir o Najd como geralmente entendido, do teor do hadîth do Najd, requis ingenuidade considerável dos escritores pró-Najd dos dias de hoje. Alguns apologistas tentam juntar esse hadîth com um grupo de outros ahâdîth que associam o “chifre do diabo” com “o Oriente”, que é supostamente uma referência genérica ao Iraque. Enquanto é verdade que alguns comentários medievais tardios também se inclinam a essa visão, o conhecimento geográfico moderno claramente o desconsidera. Até mesmo uma olhada breve num atlas moderno mostrará que uma linha reta desenhada ao leste de al-Madîna al-Munawwara (Medina) não passa em lugar nenhum perto do Iraque, mas passa a alguma distância do sul de Riade; isto é, através do centro exato do Najd. Os ahâdîth que falam do “Oriente” nesse contexto daí apoiam a visão de que o Najd que é indicado, não o Iraque.

Na ocasião os apologistas pró-Najd também citam o sentido etimológico da palavra árabe najd, que significa “terra alta”. De novo, uma consulta breve num atlas resolve esse assunto decisivamente. Com a exceção do norte do Iraque de hoje, que não era considerado parte do Iraque por nenhum muçulmano até o presente século (era chamado de “al-Jazîra”, “a Ilha”), o Iraque é notavelmente plano e baixo, muito dele sendo até hoje sendo pantanoso, enquanto o restante, para cima e bem para o norte de Bagdá é plano, deserto baixo ou terra agrícola. O Najd, contrastantemente, é na maior parte um planalto, culminando em picos tais como Jabal Tayyi’ (1.300m), na cordilheira de Jabal Shammar. É difícil ver como os árabes poderiam rotineiramente aplicar um termo topográfico significando “planalto” para o terreno plano do sul do Iraque (o mesmo território que se provou apto para combates de tanque durante a “Guerra do Golfo” de 1991, que é uma fonte notável de disputa entre o “Cavaliers” e “Roundheads” de Riade).

A confirmação dessa identificação é facilmente localizada na literatura de hadîth, que contém referências numerosas ao Najd, todas claramente denotando a Arábia Central. Para pegar alguns exemplos de muitas dúzias deles: há o hadîth narrado por Abu Dâwûd (Salât al-Safar, 15), que é o seguinte: “Fomos para o Najd com o Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) até que chegamos em Dhât al-Riqâ‘, onde encontramos com um grupo de Ghatafân [uma tribo najdita].” Em al-Tirmidhi (Hajj, 57), há o registro de um encontro entre o Mensageiro (s.a.w.s.) e uma delegação najdita que ele recebeu em ‘Arafa (veja também Ibn Mâja, Manâsik, 57). Em nenhum caso do tipo a Sunna indica que o Iraque era de alguma maneira incluso na definição profética de “Najd”.

Mais evidências podem ser citadas do amontoado de hadîth que identificam os pontos miqat para os peregrinos. Num hadîth narrado pelo Imâm al-Nasâ’i (Manâsik al-Hajj, 22), ‘Â’isha (r.a.) declarou que “ O Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) estabeleceu o miqat para o povo de Medina em Dhu’l-Hulaifa, para o povo da Síria e do Egito em al-Juhfa, para o povo do Iraque em Dhât ‘Irq, e para o povo do Najd em Qarn e para o povo do Iêmen fica em Yalamlam.”

Esses textos constituem prova indiscutível de que o Profeta (s.a.w.s.) distinguiu entre o Najd e o Iraque, tanto que apontou dois miqat separados para os habitantes de cada. Para ele, claramente, Najd não incluía o Iraque.

O Najd no Hadîth
Há muitos ahâdîth nos quais o Mensageiro (s.a.w.s.) elogia terras particulares. É significante que embora o Najd seja mais próximo das terras de Meca e Medina, não é elogiado por nenhum desses ahâdîth. O primeiro hadîth citado acima mostra a disposição do Mensageiro (s.a.w.s.) para orar pela Síria e Iêmen, e sua recusa insistente de orar pelo Najd. E onde quer que o Najd fosse mencionado, era claramente visto como um território problemático. Considere, por exemplo, o seguinte hadîth nobre:

‘Amr ibn Abasa disse: O Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) foi um dia revisar os cavalos, na companhia de ‘Uyaina ibn Hisn ibn Badr al-Fazari. […] ‘Uyaina observou: “O melhor dos homens são aqueles que carregam suas espadas sobre seus ombros e carregam suas lanças nos cabos de tecido de seus cavalos, vestindo capas, e são do povo do Najd.” Mas o Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) respondeu: “Você mente! Pelo contrário, os melhores dos homens são os homens do Iêmen. A fé é iemenita, o Iêmen [das tribos] de Lakhm e Judham e Amila. […] Hadramaut é melhor que a tribo de Hârith; uma tribo é melhor que a outra; outra é pior […] Meu Senhor me ordenou que amaldiçoasse Quraish, e os amaldiçoei, mas Ele então me ordenou que os abençoasse duas vezes, e assim o fiz […] Aslam e Ghifar, e seus sócios de Juhaina são melhor que Asad e Tamîm e Ghatafân e Hawâzîn na visão de Allah no Dia da Ressureição. […] As tribos mais numerosas no Jardim serão [as tribos iemenitas de] Madhhij e Ma’kûl.’ (Ahmad ibn Hanbal e al-Tabarâni, por narradores autênticos. Citado em ‘Ali ibn Abu Bakr al-Haithami, Majmâ‘ al-Zawâ’id wa Manbâ‘ al-Fawâ’id [Cairo, 1352], X, 43).

O Mensageiro (s.a.w.s.) diz “você mente!” para um homem que elogia o Najd. Em lugar algum ele exalta o Najd – bem pelo contrário. Mas outros ahâdîth em louvor a outras terras abundam. Por exemplo:

Umm Salâma narrou que o Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) deu o seguinte conselho em seu leito de morte: “Por Allah, conjuro-O, em relação aos egípcios, pois serão vitoriosos sobre eles, eles serão um suporte para você e ajudantes no caminho de Allah.” (Tabarâni, classificado por al-Haithami com sahîh [Majmâ‘, X, 63].) (Para mais sobre o mérito dos egípcios veja Sahîh Muslim, comentário pelo Imâm al-Nawawi [Cairo, 1347], XVI, 96-7.)

Qais ibn Sa‘d narrou que o Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) disse: “Fosse a fé suspensa desde as Plêiades, homens dos filhos de Fâris [Irã centro-sul] a alcançariam.” (Narrado nos Musnads de ambos Abu Ya‘la e al-Bazzâr, classificado como sahîh por al-Haithami. Majmâ‘, X, 64-5. Veja mais comentários de al-Nawawi do Sahîh Muslim, XVI, 100.)

O Mensageiro de Allah disse: “Tranquilidade (sakîna) está no povo do Hijâz.” (al-Bazzâr, citado em al-Haithami, X, 53.)

Na autoridade de Abu’l-Darda (r.a.), o Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) disse: “Encontrarão exércitos. Um exército na Síria, no Egito, no Iraque e no Iêmen.” (al-Bazzâr e al-Tabarâni, classificado como sahîh: al-Haithami, Majmâ‘, X, 58.) Isso constitui em elogiar essas terras como lares de voluntários de jihâd.

“Os anjos do Todo-Compassivo estendem suas asas sobre a Síria.” (Tabarâni, classificado como sahîh: Majmâ‘, X, 60. Veja também al-Tirmidhi, comentário do Imâm Muhammad ibn ‘Abd al-Rahmân al-Mubârakfûri: Tuhfat al-Ahwadhi bi-Sharh Jami‘ al-Tirmidhi, X, 454; quem o confirma como hasan sahîh.)

Abu Huraira narrou que o Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) disse: “O povo do Iêmen veio até vocês. Eles são mais tenros de coração e mais delicados de alma. A fé é iemenita, e a sabedoria é iemenita.” (Al-Tirmidhi, Fî Fadl al-Yamân, nº 4028. Mubârakfûri, X, 435, 437: hadîth hasan sahîh. Na página 436 o Imâm Mubârakfûri assinala que os ancestrais dos Ansâr eram do Iêmen.)

“O povo do Iêmen é o melhor povo sobre a terra.” (Abu Ya‘la e al-Bazzâr, classificado como sahîh. Al-Haithami, X, 54-5.)

O Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) enviou um homem para um dos clãs dos árabes, mas eles o insultaram e o espancaram. Ele chegou ao Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) e lhe contou o que ocorrera. E o Mensageiro (s.a.w.s.) disse: “Fosse você ao povo de Omã, não o teriam nem isultado nem o espancado.” (Muslim, Fadâ’il al-Sahâba, 57. Veja o comentário de al-Nawawi, XVI, 98: “isso indica louvor a eles, e seu mérito.”)

Os ahâdîth acima são selecionados de um corpus substancial de material que registra o Mensageiro (s.a.w.s.) louvando regiões vizinhas. De novo, é impactante que embora o Najd fosse mais próximo que qualquer outra terra, ahâdîth em louvor dali são completamente ausentes.

Esse fato é geralmente sabido, embora não publicado, pelos próprios najditas. É claro que se existisse um hadîth pelo menos que nomeasse e louvasse o Najd, fariam a Umma saber. Para tentar contornar ou neutralizar as condenações proféticas explícitas e implícitas da sua província, alguns se recusam a considerar que os ahâdith deveriam ser de qualquer forma dignos de atenção, e focar seus comentários nos agrupamentos tribais que moram no Najd.

A Tribo de Tamîm
A tribo mais conhecida da Arábia Central são os Banu Tamîm. Há ahâdîth que elogiam virtualmente todos dos maiores grupos tribais árabes, e para indicar a extensão desse louvor alguns exemplos estão listados aqui:

O Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) disse: ‘Ó Allah, abençoe [a tribo de] Ahmas e seus cavalos e seus homens sete vezes.’ (Ibn Hanbal e Haithami, Majmâ‘, X, 49. De acordo com al-Haithami seus narradores são todos confiáveis.)

Ghalib b. Abjur disse: “Mencionei Qais na presença do Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) e ele disse: ‘Que Allah mostre sua misericórdia para Qais.’ Ele foi perguntado: ‘Ó Mensageiro de Deus! Está pedindo Sua misericórdia para Qais?’ e ele respondeu: ‘Sim. Eles seguiam a religião do nosso pai Ismael, filho de Abraão, Amigo de Allah. Qais! Saúde nosso Iêmen! Iêmen! Saúde nosso Qais! Qais é a cavalaria de Allah sobre a terra.’” (Tabarâni, declarado sahîh por al-Haithami, X, 49.)

Abu Huraira narrou que o Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) disse: “O quão excelente povo é Azd, de boca doce, honrosos de seus votos e puros de coração!’ (Ibn Hanbal, via um isnad bom (hasan), de acordo com al-Haithami, X, 49.)

Anas b. Mâlik disse: “Se não fôssemos dos Azd, não seríamos da raça humana.” (al-Tirmidhi, Manâqib, 72; confirmado por Mubârakfûri, X, 439 como hasan gharîb sahîh.)

‘Abdallah ibn Mas‘ûd disse: “Testemunhei o Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) orando por seu clã de Nakh.” Ou ele disse: “Ele disse: “Ele os elogiou até que desejei que eu fosse um deles.” (Ibn Hanbal, com um isnad genuíno. Al-Haihami, X, 51.)

Sob a autoridade de ‘Abdallah ibn ‘Amr ibn al-’As, que disse: “Ouvi o Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) dizer: ‘Esse comando [o califado] será em Quraish. Ninguém se oporá a eles sem ser humilhado em sua face por Allah, por quanto quer que dure sua religião.”’ (al-Bukhâri, Manâqib, 2.)

O hadîth que surge para elogiar Tamîm é então não excepcional, e não pode por nenhuma extensão da imaginação ser empregado para indicar a superioridade de Tamîm sobre as outras tribos. De fato, fora dessa vasta literatura sobre os méritos das tribos, somente um relato significante elogia Tamîm. É como segue: Abu Huraira disse: “Continuei a amar Banu Tamîm depois de ouvir três coisas relativas a eles do Mensageiro de Allah (s.a.w.s.): ‘Eles serão os mais severos da minha Ummah depois do Dajjâl (Anticristo): um deles era um cativo pertencente a ‘Â’isha, e ele disse: ‘Libere-a, pois ela é uma descendente de Ismael;’ e quando seu zakât veio, ele disse: ‘Esse é o zakât dum povo,’, ou ‘do meu povo.’” (Al-Bukhâri, Maghâzi, 68.)

Esse hadîth claramente indica que o rigor dos tamimitas será usado em prol, não contra o Islã na batalha final culminante contra o Dajjâl; e isso é inquestionavelmente um mérito. O segundo ponto é menos significante, já que todos os árabes são descendentes de Ismael; enquanto as leituras variantes do terceiro ponto torna difícil se estabelecer sua significância de uma maneira não ambígua. Mesmo a interpretação mais positiva, entretanto, nos permite concluir nada além de que o Mensageiro (s.a.w.s.) se agradou daquela tribo no momento em que pagou seu zakât. Como podemos ver, seu pagamento de zakât provou ser de curta duração.

Muito mais numerosos são os ahâdîth que explicitamente criticam os tamimitas. Esses ahâdîth são geralmente desconsiderados pelos apologistas pró-najditas; mas a erudição islâmica tradicional exige que tudo, não apenas algo, de evidência seja juntada e tomada como um todo antes de um veredito ser alcançado. E uma consideração do material crítico abundante sobre Tamîm demonstra além de qualquer dúvida de que sua tribo era vista pelo Mensageiro (s.a.w.s.) e pelos Salaf como profundamente problemática.

E uma antiga indicação da natureza dos tamimitas é dada por Allah mesmo na Sûrat al-Hujurât. Na âya 4 dessa sura, Ele diz: “Aquele que chama você detrás das câmaras: a maioria deles não têm nenhuma razão.’ A ocasião para a revelação (sabâb al-nuzûl) é como segue:

“As ‘câmaras’ (hujurât) são espaços fechados por paredes. Cada uma das esposas do Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) tinha uma. A âya foi revelada em conexão com a delegação dos Banu Tamîm que vieram ao Profeta (s.a.w.s.). Entraram na mesquita e se aproximaram das câmaras das esposas. Eles ficaram do lado de fora e chamavam: ‘Muhammad! Saia para nós!’, uma ação que exprimia um bastante grosseria, crueza e desrespeito. O Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) esperou um pouco, e então saiu para eles. Um deles, conhecido como al-Aqra‘ ibn Habis, disse: ‘Muhammad! Meu elogio é um ornamento e minha denúncia traz vergonha!’ E o Mensageiro (s.a.w.s.) responde: ‘Ai de você! Esse é o dever de Allah.’” (Imâm Muhammad ibn Ahmad ibn Juzayy, al-Tashil [Beirute, 1403], p.702. Veja também as outras obras de tafsîr: também Ibn Hazm, Jamharat Ansâb al-‘Arab [Cairo, 1382], 208, no capítulo sobre Tamîm.)

Junto com essa crítica alcorânica, ahâdîth abundantes também suprem a Umma com conselhos sobre essa tribo. Já que a aceitação tácita do Profeta (s.a.w.s.) constitui um hadîth, podemos começar pelo incidente seguinte:

Isto se relaciona com o famoso poema por Hasan ibn Thâbit (r.a.). Os tamimitas eram convertidos tardios do Islã, se juntando à religião, depois de muita resistência, somente no Ano das Delegações (‘Am al-Wufud), que foi no nono ano da Hégira. Eles então perderam a virtude de sabiqa, de precedência no Islã. Vindo por último ao Profeta (s.a.w.s.), os tamimitas insistiram num debate público contra ele, e ele apontou Hasan para responder aos tamimitas em sua presunção vã sobre sua tribo. A ode de Hasan, que completamente os derrotou e humilhou descrevendo o baixo status da tribo deles, pode ser considerada evidência para a visão do próprio Profeta (s.a.w.s.) sobre Tamîm, já que a condenação foi dada em sua presença, e não há registro de ele a criticando. (Dîwân Hasan ibn Thâbit [Beirute, 1966], p.440; para detalhes completos do incidente veja o comentário de al-Barqûqi no mesmo volume. Veja também Ibn Hishâm, Sîra [tradução de Guillaume], p.631.)

Um outro hadîth mais sobre Tamîm é o seguinte:

Sob a autoridade de ‘Imrân ibn Husain (r.a.): “Um grupo de tamimitas veio ao Profeta (s.a.w.s.), e ele disse: ‘Ó tribo de Tamîm! Receba as boas novas!’ ‘Você nos promete boas novas, então nos dê alguma coisa [de dinheiro]!’, responderam. E sua face mudou. Então alguns iemenitas vieram, e ele disse: ‘Ó povo do Iêmen! Aceite as boas novas, ainda que a tribo de Tamîm não as tenha aceitado!’ E eles disseram: ‘Aceitamos.’ E o Profeta (s.a.w.s.) começou a falar sobre o começo da criação, e sobre o Trono. (Al-Bukhâri, Bad’ al-Khalq, 1.)

A rebeldia dura da mentalidade tamimita documentada no Alcorão e hadîth lança uma luz interessante sobre a personalidade de Abu Jahl, o líder arquipagão de Quraish. Abu Jahl, com seu ódio fanático do Profeta (s.a.w.s.) deve ter sido moldado pela ética tamimita em sua infância. Sua mãe, Asma’ bint Mukharriba, era da tribo de Tamîm. (al-Jumahi, Tabaqat Fuhul al-Shu‘arâ’, ed. Mahmûd Shâkir [Cairo, 1952], p.123.) Ele também se casou com a filha de ‘Umair ibn Ma‘bad al-Tamîmi, pela qual ele teve seu filho, previsivelmente chamado de Tamîm. (Mus‘ab ibn ‘Abdallah, Nasab Quraish [Cairo, 1953], p.312.)
Um atributo recorrentemente atribuído aos tamimitas na literatura de hadîth é o de zelo mal colocado. Quando eles finalmente entraram no Islã, eram associados com uma forma fanática de piedade que demandava aderência simples e rígida, em vez de entendimento; e que frequentemente desafiava as autoridades estabelecidas da religião. O Imâm Muslim registra uma narração de ‘Abdallah ibn Shaqîq que é a seguinte: “Ibn ‘Abbâs uma vez pregou para nós depois da reza do ‘Asr, até o sol se pôr e as estrelas aparecerem, e as pessoas começaram a dizer: ‘A reza! A reza!’ Um homem dos Banu Tamîm veio até ele e disse, constante e insistentemente: ‘A reza! A reza!’ E Ibn ‘Abbâs respondeu: ‘Vocês estão me ensinando a sunna, seus desgraçados?’” (Muslim, Salât al-Musâfirîn, 6.)

Os Banu Tamîm e os Kharijitas
Talvez o hadîth mais conhecido de todos sobre um tamimita, que de novo chama nossa atenção para seu zelo deslocado, é o hadîth de Dhu’l-Khuwaisira:

Abu Sa‘îd al-Khudri (r.a.) disse: “Estávamos uma vez na presença do Mensageiro de Allah (s.a.w.s.) equanto ele dividia os espólios de guerra. Dhu’l-Khuwaisira, um homem da tribo de Tamîm, veio até ele e disse: ‘Mensageiro de Allah, seja justo!’ Ele respondeu: ‘Ai de você! Quem será justo se eu não o for? Você está perdido e desapontado se eu não for justo!’ E ‘Umar (r.a.) disse: ‘Mensageiro de Allah! Dê-me permissão para lidar com ele, para que assim eu possa cortar-lhe a cabeça!’ Mas ele disse: ‘Deixe-o. E ele tem companheiros. Um de vocês desprezaria sua reza em sua companhia e sua pressa na companhia deles. Eles recitam o Alcorão mas não passa além das suas vértebras do pescoço. Eles passam pela religião como uma flecha passa por seu alvo.’” Abu Sa‘îd continuou: “Juro que eu estava presente quando ‘Ali ibn Abi Tâlib lutou contra eles. Ele mandou que aquele homem fosse buscado, e nos foi trazido.’ (Al-Bukhâri, Manâqib, 25. Para o “passar além” veja Abu’l-’Abbâs al-Mubarrad, al-Kâmil, capítulo sobre ‘Akhbar al-Khawârîj’ publicado separadamente por Dâr al-Fikr al-Hadîth [Beirute, n.d.], pp.23-4: “geralmente quando isso acontece nada do sangue do alvo permanece sobre ele”.)

Esse hadîth foi tomado pelos exegetas como uma profecia e um alerta, sobre a natureza dos kharijitas. Há um certo tipo de fanático que leva a religião tão duramente que ele vai parar do outro lado, com pouco ou nada dela permanecendo com ele. Um especialista que confirma isso é o sábio hanbali Ibn al-Jauzi, famoso por suas hagiografias of Ma‘rûf al-Karkhi e Rabi‘a al-Adawiya. Em seu livro Talbis Iblîs (Beirute, 1403, p.88), sob o capítulo intitulado “Uma Menção da Ilusão do Diabo sobre os Kharijitas”, ele narra o hadîth, e então escreve: “Esse homem era chamado Dhu’l-Khuwaisira al-Tamîmi. […] Ele foi o primeiro kharijita no Islã. Seu erro foi se satisfazer com sua própria visão; se tivesse parado, teria percebido que não há visão superior àquela do Mensageiro de Allah (s.a.w.s.)”

Ibn al-Jauzi prossegue para documentar o desenvolvimento do movimento kharijita e o papel central feito pela tribo de Tamîm nele. Assim (p.89) “O comandante da luta [contra os sunitas, em Harûra] era Shabîb ibn Rab‘i al-Tamîmi’; também (p.92) ‘Amr ibn Bakr al-Tamîmi concordou em assassinar ‘Umar”. Tudo isso embora seu acampamento se parecer com uma colmeia, tão assiduamente estavam recitando o Alcorão (p.91).

O movimento kharijita em si começou na arbitragem de Siffîn quando os primeiros dissidentes deixaram o exército do califa ‘Ali (k.A.w.). Um deles era Abu Bilâl Mirdas, um membro da tribo de Tamîm (Ibn Hazm, 223) que, a despeito de sua adoração e recitação do Alcorão constantes se tornou um dos mais brutais dos fanáticos kharijitas. Ele é lembrado como o primeiro que disse o Tahkîm – a fórmula “O julgamento é só de Allah” – no dia de Siffîn, que se tornou o slogan da da’wa kharijita tardia.

Na sua longa análise do movimento kharijita, o Imâm ‘Abd al-Qâhir al-Baghdâdi também descreve o envolvimento íntimo dos tamimitas e do árabes centrais em geral, notando que as tribos do Iêmen e do Hijâz não contribuíram com quase ninguém para as forças kharijitas. Ele nos dá um relato das atividades kharijitas tardias de Dhu’l-Khuwaisira. Apararecendo diante do Imâm ‘Ali ibn Abi Tâlib (k.A.w.) ele diz: “Ibn Abi Tâlib! Somente o combato por causa de Deus e do Além!”, ao que o Imâm responde: “Não, você é como aqueles sobre quem Allah diz: ‘Informaria a vocês quem são aqueles cujas obras estão na maior parte perdidas? São aqueles cujos esforços são em vão na vida desse mundo, mas que pensam que estão fazendo o bem!” [Sûrat al-Kahf, 103].’ (Imâm ‘Abd al-Qâhir al-Baghdâdi, al-Farq bain al-Firaq [Cairo, n.d.], 80)

Com o Imâm ‘Abd al-Qâhir dando seu relato das primeiras rebeliões kharijitas, repletas com massacres assombrosos de civis muçulmanos inocentes, deixa claro que os líderes de cada um dos movimentos kharijitas significantes precipitaram do Najd. Por exemplo, o Azariqa, um dos movimentos kharijitas mais perversos e difundidos, foi liderado por Nafi‘ ibn al-Azraq, que era da tribo árabe central dos Banu Hanîfa (‘Abd al-Qâhir, 82). Como o Imâm registra: “Nâfi e seus seguidores consideraram o território daqueles que os opuseram de Dâr al-Kufr, no qual se pode abater suas mulheres e crianças.[…] Constumavam dizer: “Nossos oponentes são mushrikîn, e assim não somos obrigados a devolver qualquer coisa que deixamos na confiança deles.” (‘Abd al-Qãhir, 84.) Depois da sua morte em batalha, “o Azariqa tomou aliança com ‘Ubaidallah ibn Ma’mûn al-Tamîmi. Al-Muhallab então os combateu em Ahwaz, onde ’Ubaidallah ibn Ma’mûn mesmo morreu, junto com seu irmão ’Uthmân ibn Ma’mûn e trezentos dos mais fanáticos do Azariqa. A lembrança recuou para Aidaj, onde tomou aliança com Qatari ibn al-Fuja’a, a quem lhe chamou de Amîr al-Mu’minîn.’ (‘Abd al-Qâhir, 85-6.) O comentador do texto de ‘Abd al-Qâhir nos relembra que Ibn Fuja’a também era de Tamîm (p.86).

O Azariqa, que massacrou incontáveis dezenas de milhares de muçulmanos que se recusaram a aceitar suas visões, tem um rival na facção Najdiyya dos kharijitas. Esses foram nomeados assim por causa de Najda ibn Amir, um membro da tribo de Hanîfa cuja pátria é o Najd; Najda mesmo manteve seu exército em Yamâma, que é parte do Najd. (‘Abd al-Qâhir, 87.)

Como é a maneira do kharijismo em todas as eras, a Najdiyya se fragmentou por discussões acaloradas geradas por sua intolerância de qualquer dissidente. As causas dessa cisma incluem o ataque kharijita a Medina, que saiu com vários cativos; e ijtihads kharijitas diferentes sobre relações sexuais com mulheres muçulmanas que, não sendo kharijitas, eles escravizaram. Três facções maiores emergiram dessa divisão, a mais perigosa era liderada por Atiyya ibn al-Aswad, de novo da tribo de Hanîfa. Depois da morte de Najda, sua própria facção se dividiu, de novo em três, que deixou o Najd para pilhar a vizinhança de Basra (‘Abd al-Qãhir, 90-1).

A última maior seita kharijita foi a ‘Ibâdiyya que, duma forma muito mais gentil e mais atenuada, retém uma presença até mesmo hoje em Zanzibar, sul da Argélia e Omã. O movimento foi fundado por ‘Abdallah ibn ‘Ibâd, outro tamimita. Sua doutrina mais famosa é de que não ‘ibâdis são kuffâr: eles não são mu’minîn, mas também não são mushrikîn. “Proíbem assassinatos secretos [de não ‘ibâdis], mas permitem batalhas abertas. Eles permitem casamentos ´[com não ‘ibadis] e herança. Alegam que tudo isso é para ajudá-los na sua guerra por Allah e o Seu Mensageiro.” (‘Abd al-Qâhir, 103.)

A mulher mais famosa entre os kharijitas era Qutam bint ‘Alqama, um membro da tribo tamimita. Ela é lembrada como aquela que disse a seu noivo, Ibn Muljam, que “só o aceitarei como meu marido com um dote que eu mesmo designarei, que é três mil dirhams, um escravo e uma escrava, e o assassinato de ‘Ali!” Ele perguntou: “Você terá tudo isso, mas como eu poderia cumpri-lo?” e ela respondeu: “Pegue-o de surpresa. Se você escapar, terá resgatado as pessoas do mal, e viverá com sua esposa; se morrer tentando, irá para o Jardim e um deleite sem fim!” (Mubarrad, 27.) Como é geralmente sabido, Ibn Muljam foi executado depois que apunhalou o Imãm ‘Ali (k.A.w.) até a morte fora da mesquita em Kûfa.

Muçulmanos ansiosos para não repetir os erros trágicos do passado desejariam refletir profundamente sobre esse padrão de eventos. Dezenas de milhares de muçulmanos, ferventemente compromissados com a fé e destacados por sua piedade prática, apesar disso caíram presas à tentação kharijita. Os ‘ulamâ’ traçam a origem dessa tentação até o incidente de Dhu’l-Khuwaisira, que considerava a si mesmo um muçulmano melhor que o próprio Profeta (s.a.w.s.). E ele, como a maioria esmagadora dos líderes kharijitas que seguiam seus passos, era um tamimita. Dos kharijitas não tamimitas, quase todos eram do Najd.

A Ridda: a Primeira Fitna
Há mais um assunto que os muçulmanos desejariam considerar quando formarem sua visão sobre o Najd. É a atitude dos najditas logo após a morte do Mensageiro (s.a.w.s.). Os historiadores afirmam que a grande maioria das rebeliões contra o pagamento de zakât que estourou durante o califado de Abu Bakr (r.a.) ocorreu entre najditas. Além do mais, e até mais significante, muitas das rebeliões najditas foram baseadas numa estranha ideologia anti-islâmica. A mais famosa dessas foi liderada por Musailima, que alegou ser um profeta e que estabeleceu uma sharî’a rival que incluía rituais “paraislâmicos” como formas de jejuar e regras de dieta. Ele seguiu as regras de reza islâmica, mas aboliu as rezas do fajr e ‘ishâ’. Uma das assim ditas “revelações” é a seguinte:

Banu Tamîm é uma tribo de pureza,
um povo livre, sem culpa sobre eles,
nem pagam tributo.
Seremos seus aliados de proteção,
bons para eles o quanto nós vivermos!
Protegeremo-los de todos
e quando morrermos, o assunto deles é com al-Rahmân.

(Imâm al-Tabari, Târîkh al-Rusul wa’l-Mulûk [Beirute, 1407], II, 276).

Musailima era um orador enérgico, e logo obteve uma grande gama de seguidores na Arábia Central. Entretanto os historiadores registram que quando ele tentou imitar os milagres do Profeta (s.a.w.s.) resultou em desastre. Crianças trazidas a ele para se curar ficavam ainda mais doentes. Quando a água do seu wudû’ era derramada sobre a plantação, a terra ficava estéril. Poços que ele usava ficavam salgados. Entretanto o poder do tribalismo fez muita gente nem prestar atenção nisso.

Talha al-Namari veio ao Najd e disse: “Onde está Musailima?” Nisso as pessoas disseram: “Cuidado! Chame-o de Mensageiro de Allah!” Assim ele respondeu: “Não, até que o veja.” Assim quando eles se encontraram ele disse: “Você é Musailima,” e ele respondeu: “Sim.” Ele disse: “Quem veio para você?” e ele respondeu: “Al-Rahmân.” Ele perguntou: “Ele veio na luz ou na escuridão?” “Na escuridão.” Com isso disse: “Testemunho que você é um mentiroso e que Muhammad diz a verdade, mas um mentiroso da sua tribo é mais querido para mim que um contador de verdades da dele.” Assim ele se juntou a Musailima até que fosse morto na Batalha de al-Aqraba. (Al-Tabari, II, 277).

Incidentes como esse são reveladores de duas formas. Primeiro, mostram a característica específica da ‘aqîda de Musailima: Allah é semelhante a um ser físico que pode “vir”. Segundo, revela o poder imenso e cegante do tribalismo árabe que ainda existia no Najd.

Como um líder de uma religião rival, ele e seus entusiastas najditas esatavam em estado de baghi, revolta herética contra a autoridade califal, e Abu Bakr (r.a.) enviou um exército contra eles sob Khâlid ibn al-Walîd. No ano 12 da Hégira, Khâlid derrotou os najditas na batalha de al-Aqraba, um embate sangrento que se centrou num jardim murado que é conhecido pelos nossos historiadores como o Jardim da Morte, porque centenas de grandes Companheiros perderam suas vidas ali nas mãos dos najditas. A batalha alcançou o espírito do Islã contra o velho tribalismo árabe, como mostrado pelo fato de que o estandarte dos Muhâjirûn era erguido por um escravo liberto persa, Salîm, enquanto o estandarte dos Ansâr era erguido alto por Thâbit b. Qais. O grito de batalha muçulmano não era a invocação duma tribo ou dum ancestral, em vez disso era “Yâ Muhammad!” (al-Tabari, 281.) O pseudoprofeta foi morto por Wahshi, o escravo etíope que, embora tivesse matado Hamza ibn Abd al-Muttalib, fez bem ao Islã, e era agora um membro honrado da comunidade. A morte do profeta do orgulho najdita por um homem de tais origens humildes foi um símbolo poderoso dos princípios que estavam sendo ditos. (Veja ‘Abdallah ibn Muslim Ibn Qutaiba, Kitâb al-Ma‘ârif [Cairo, 1960], p.206; Ahmad ibn Yahya al-Baladhuri, Futûh al-Buldân [reimpr. Beirute, n.d., p.86.])

A devoção a Musailima persistiu na Arábia Central, entretanto. Uma indicação de que a continuidade da vida religiosa dos najditas é dada pelo viajante não muçulmano Palgrave, que por volta de 1862 encontrou alguns homens, líderes najditas que continuaram a reverenciar Musailima como um profeta. (W. Palgrave, “Narrative of a Year’s Journey through Central and Eastern Arabia” [Londres, 1865], I, 382.)

O grande chefe da rebelião najdita contra o califado era uma mulher chamada Sajah, cujo nome completo era Umm Sadir bint ‘Aus, e que pertencia a tribo de Tamîm. Ela alegava uma profecia no nome de um rabb que estava “nas nuvens” e que lhe deu revelações pelas quais ele obteve sucesso em unir divisões dos tamimitas que discutiam entre si sobre a extensão em que deveriam rejeitar a autoridade de Medina. Liderando várias campanhas contra tribos que permaneceram leais ao Islã, a profetisa najdita é dita ter lançado sua sorte a Musailima. Fora isso, pouco é sabido do seu destino. (Ibn Qutaiba, Ma‘arîf, p.405; Baladhuri, Futûh, p.99-100.)

Tendências Najditas Recentes
É bem sabido que o reformador najdita Muhammad ibn ‘Abd al-Wahhâb era um tamimita. A violência e takfîr associado com o movimento que carrega seu nome certamente carrega mais do que uma semelhança coincidente com as políticas e mentalidade dos kharijitas tamimitas do antigo Najd. Considere, por exemplo, o seguinte massacre, dos xiitas de Karbalâ’ em abril de 1801, como descrito por um historiador wahhâbi:

Sa’ûd venceu em Karbalâ’ com seu exécito vitorioso, cavalos famosos de raça e todas as pessoas estabelecidas e os beduínos do Najd […] Os muçulmanos (isto é, os wahhâbis) cercaram Karbalâ’ e a tomaram de supetão. Mataram a maioria das pessoas nos mercados e casas. Não se pode contar seus espólios. Ficaram ali só uma manhã, e partiram depois do meio-dia, levando embora todas as suas posses. Quase duas mil pessoas foram mortas em Karbalâ’. (‘Uthmân ibn Bishr, Unwân al-Majd fi Târîkh Najd [Meca, 1349], 1, 121-122.)

É difícil distinguir esse assalto, e a brutalidade de sua realização, dos assaltos kharijitas de Najd para a mesma região mil anos antes.
Muhammad Finati, um revertido italiano ao Islã que serviu o exército califal que derrotou os wahhâbis, escreveu um longo relato de próprio punho do barbarismo extremo das hordas najditas. Por exemplo:

Tais entre nós que caímos vivos nas mãos desses fanáticos cruéis, fomos despreocupadamente mutilados nos cortando fora os braços e pernas, e deixados para perecer nesse estado, alguns de nós, durante nosso recuo; eu pessoalmente vi que não tinha outro favor maior para pedir do que nós os matássemos. (G. Finati, Narrativa da Vida e Aventuras de Giovanni Finati [Londres, 1830], I, 287.)

Às vezes se afirma que os dias quando “todas as pessoas estabelecidas e os beduínos do Najd” iriam felizes cometer tal assassinato em massa já se foi há muito, e que o wahhâbismo se tornou mais moderado. Mas outro exemplo mais recente mostra o inverso. Em 1924, o exército wahhâbi entrou na cidade de Ta’if, pilhando-a por três dias. O qadi chefe e os ‘ulamâ’ foram arrastados de suas casas e abatidos, enquanto várias centenas de outros civis perderam suas vidas. (Ibn Hizlul, Târîkh Mulûk Âl Sa‘ûd [Riade, 1961], p.151-3.) Depois de dar à população sunita do Hijâz sua lição terrorista, “Ibn Sa’ûd ocupou Meca com a bênção tácita da Inglaterra”. (Alexei Vassiliev, Uma História da Arábia Saudita [Londres, 1998], p.264).

CONCLUSÃO
Uma boa quantidade de material sobre o Najd e Tamîm foi preservado do tempo dos Salaf. Se rejeitarmos o método de alguns apologistas najditas, um método baseado na citação altamente seletiva de ahâdîth junto com a imitação cega de opiniões expressas pelos escritores comentaristas medievais tardios, podemos alcançar algumas conclusões razoavelmente estabelecidas e autoritativas quanto à Arábia Central e seu povo. O Alcorão os ahâdîth autênticos e a experiência dos Salaf concordam esmagadoramente que a Arábia Central é uma região de fitna. A primeira de todas as fitnas no Islã emergiu daquele lugar, notavelmente a arrogância de Dhu’l-Khuwaisira e gente do tipo, e também a apostasia e tendência a falsos profetas que causou tanta dificuldade para Abu Bakr (r.a.). Subsequentemente, a heresia kharijita, esmagadoramente najdita em suas raízes, lançou uma sombra sobre o início da história do Islã, dividindo os muçulmanos, distraindo seus exércitos da tarefa de conquistar o Bizâncio e injetando rancor, suspeita e amargura entre as primeiras gerações de muçulmanos. Só o simpatizante najdita mais determinado, cegado e irresponsável poderia ignorar essa evidência, transmitida tão confiantemente dos Salaf puros, e persistir na ilusão de que o Najd e o rigorismo desviado e literalista que recorrentemente é produzido por isso estariam de algum modo em alguma área favorecida por Allah.

E Allah sabe melhor. Que Ele una a Umma através do amor pelos primeiros muçulmanos que recusaram a intolerância, e que Ele nos preserve da armadilha do kharijismo e daqueles que são atraídos a essa mentalidade em nosso tempo. Âmîn.

Fonte: https://masud.co.uk/puncturing-the-devils-dream-about-the-hadiths-of-najd-and-tamim/

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