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A Raiz da Divisão Sectária do Iraque

Qual a raiz da divisão Sectária do Iraque? Leia e entenda como o país se dividiu no que antes era uma nação unida.
  • O Iraque surgiu durante o período colonial britânico do Oriente Médio após a Primeira Guerra Mundial.
  • Suas fronteiras criadas de maneira arbitrária, não levaram em conta a pluralidade cultural que havia dentro daqueles territórios colonizados.
  • Os britânicos ajudaram a instaurar uma monarquia e uma elite sunita no país, que são a minoria da população, e isso é motivo de conflito até os dias atuais.

A terra do Iraque é o lar de algumas das civilizações mais antigas e preciosas da história. No vale da Mesopotâmia, que abrange os rios Tigre e Eufrates, a Babilônia, o primeiro império do mundo nasceu. A escrita foi desenvolvida pela primeira vez ao longo das margens dos rios com as tabuletas de argila. Burocracias governamentais avançadas foram implementadas pela primeira vez aqui. É realmente um dos berços da civilização humana.

E quando o Islam foi revelado nos desertos da Arábia ao sul da Mesopotâmia, o povo do Iraque foram alguns dos primeiros a aceitarem o Islam fora da Península Arábica, durante o califado de Abu Bakr. Como a história islâmica continuou, o Iraque tornou-se um dos centros do mundo muçulmano, com Bagdá a ser estabelecida no século 8 como a capital do califado abássida. Política, cultura, ciência, religião e tudo floresceu aqui no início da história islâmica. Após a invasão mongol, no entanto, a importância do Iraque diminuiu, ele acabou se tornando uma parte do Império Otomano a partir do início de 1500 até o final do império na Primeira Guerra Mundial. Depois da guerra, foi organizado em um mandato controlada pelos britânicos, que procuraram criar um Estado-nação independente nesta terra antiga.

O que nos leva à perguntar: o que é o Iraque? Os britânicos acharam que haviam encontrado um povo homogêneo nesta terra que facilmente se aglutinariam em uma nação unida mas a realidade foi muito mais complicada. Quando os britânicos criaram as fronteiras do Iraque, as pessoas de dentro dessas falsas fronteiras eram de diferentes etnias, crenças religiosas e línguas, porém eles acreditavam que eles deveriam adotar uma nova identidade – Iraquiana – e funcionar como uma nação moderna europeia nacionalista. Este artigo irá abordar as origens desses problemas de identidade no século 20 no Iraque.

Mandato Britânico

Mapa de grupos étnicos e religiosos no Iraque
Mapa de grupos étnicos e religiosos no Iraque

Após a queda do Império Otomano na Primeira Guerra Mundial, os britânicos e franceses encontraram-se no controle de toda a área do Crescente Fértil: as nações modernas do Iraque, Kuwait, Síria, Líbano, Jordânia e Palestina. Em conformidade com o Acordo secreto Sykes-Picot que eles assinaram com os franceses, os ingleses concordaram em dividir a terra entre si e os franceses, com linhas arbitrariamente desenhadas como fronteiras. Na parte oriental desta região, que viria a ser a nação do Iraque que estava dentro da esfera dos britânicos, que procuraram implementar um mandato, como fizeram com a Palestina e Jordânia. A finalidade de um mandato era criar um governo fantoche em áreas locais para os britânicos para ampliar ainda mais seus objetivos imperialistas.

Tal como acontece com os outros mandatos que os britânicos criaram, as fronteiras deste novo país eram arbitrárias. No período Otomano, a terra entre os rios Tigre e Eufrates foi organizada em três províncias diferentes, centradas em torno das cidades de Mosul, Bagdá e Basra. “Iraque” como uma entidade política não existia no período otomano, ou em qualquer momento antes disso. De fato, historicamente, o termo “Iraque” só se refere à porção sul do que hoje é considerado o Iraque, enquanto a parte norte era conhecido como “Al Jazira”.

Já que o Império Otomano era um Estado multi-étnico, por natureza, não havia demanda para todos os cidadãos otomanos assumirem uma identidade. Curdos, árabes, turcos, armênios e outros mantiveram suas identidades pessoais, desde que eles fossem leais ao governo otomano. Assim, o povo do que se tornou o Iraque não tinha noção de identidade iraquiana como um fator unificador entre si. Quando os britânicos criaram o Iraque moderno, as expectativas de uma identidade unificada iraquiana criaria enormes divisões sociais no âmbito do novo país com base em seus diferentes grupos étnicos e religiosos.

Na parte norte do mandato, a população consistia principalmente em curdos, um grupo étnico muçulmano sunita com uma língua e cultura separada dos árabes. Os curdos eram cerca de 15-20% do total da população do Iraque, mas exigiram uma nação curda – Curdistão – que reuniria as populações de minoria curda no Iraque, Síria, Turquia e Irã.

Na parte central do Iraque residia uma população árabe sunita, com base em torno da cidade de Bagdá. Eram cerca de 25% da população. Apesar disso, à eles seriam dados algumas das funções superiores do governo por seus supervisores britânicos.

Na parte sul do Iraque estavam os xiitas árabes. Eram uma maioria absoluta da população do Iraque – mais de 50%. Socialmente, eles eram muito diferentes dos árabes sunitas ao seu norte. Os ulemás xiitas (eruditos religiosos) desempenharam um papel importante na vida diária da população xiita do Iraque. Assim, os ulemás eram capazes de empunhar uma frente unida xiita, enquanto o resto do Iraque permaneceu dividido por linhas étnicas.

Unificando o Iraque

Embora os britânicos em sua maioria desconhecessem as diferenças na sociedade iraquiana, as pessoas que eles colocaram no comando do governo iraquiano eram mais informadas. Após tumultos maciços contra a proposta de mandato, os britânicos declararam o Iraque um reino e elegeu Faisal I como seu rei. Ele era um árabe sunita de Hejaz, que havia se revoltado contra o Império Otomano, ao lado dos britânicos na Primeira Guerra Mundial. Depois de uma tentativa fracassada de se tornar rei da Síria, ele migrou para o Iraque, onde se tornou rei com pouca ou nenhuma força local.

Embora Faisal fosse oficialmente o rei soberano do Iraque, os britânicos serviam como “assessores” para o seu governo. Para todos os efeitos práticos, embora o Iraque não fosse oficialmente um mandato, foi claramente não totalmente independente. Os britânicos desempenharam um papel importante nos assuntos nacionais e estrangeiros do reino do Iraque, um fato que foi profundamente ressentido pela população iraquiana.

Rei Faisal I do Iraque
Rei Faisal I do Iraque

Na esperança de preencher a lacuna entre sunitas e xiitas, Faisal tentou unificar o Iraque ao longo de linhas árabes. Ideologias seculares foram alimentadas no sistema educacional, onde esperava-se que a próxima geração se identificaria como árabes iraquianos em primeiro lugar, levando a uma nação unida. Até que a próxima geração pudesse amadurecer em sua ideologia árabe secular, Faisal teve de contar com os militares para manter a ordem. Seu corpo de oficiais árabes sunitas usaram as forças armadas para reprimirem as revoltas xiitas e os líderes tribais sunitas na década de 1920 e 1930.

Desnecessário será dizer que este foco árabe secular alienou as populações não-árabes do Iraque, especificamente os curdos no Norte. As suas reivindicações de autonomia foram amplamente ignoradas pelo governo iraquiano, já que o nacionalismo curdo não facilmente se encaixava com a ideologia nacionalista pan-árabe que estavam apoiando. Outros grupos que foram alienados por esta política eram a minoria cristã assíria do Iraque e os judeus iraquianos.

O domínio da minoria árabe sunita continuou durante todo o período de monarquia do Iraque. Em 1958, a monarquia foi derrubada e o Iraque entrou em um período de instabilidade volátil por 10 anos, que só terminou com a ascensão dos baathistas em 1968. Apesar de promoverem o secularismo e nacionalismo árabe, os baathistas, sob Saddam Hussein, continuaram a concentrar o poder nas mãos das elites árabes sunitas em Bagdá. A alienação dos curdos e xiitas árabes continuou a conduzir uma divisão na sociedade iraquiana que conduziu diretamente para a violência sectária no Iraque no início de 2000, após a invasão americana de 2003.

Enquanto o Iraque tenta se reconstruir e restaurar, no século 21, a identidade do Iraque continua sendo um problema sem solução. As fronteiras artificialmente elaboradas pelos britânicos na década de 1920 levaram a uma sociedade dividida em três segmentos distintos. Como muitas outras nações muçulmanas cujas fronteiras foram definidas pelos europeus no início do século 20, a unidade entre a população continua a ser uma meta distante. O desrespeito britânico com as identidades étnicas e religiosas do povo iraquiano levou a uma situação em que o Iraque, com os seus três povos diferentes, é incapaz de encontrar a coesão social na era dos modernos Estados-nação.

Bibliografia

Hourani, Albert Habib. A History Of The Arab Peoples. New York: Mjf Books, 1997. Print.

Ochsenwald, William, and Sydney Fisher. The Middle East: A History. 6th. New York: McGraw-Hill, 2003. Print.

Fonte: Lost Islamic History

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