O Islam xiita representa uma das principais vertentes do Islam, diferenciando-se principalmente do Islam sunita por suas crenças únicas na liderança espiritual e política da comunidade muçulmana.
Originado logo após a morte do neto do Profeta Muhammad, Hussein ibn Ali, o xiismo baseia-se na ideia de que apenas os descendentes diretos de Muhammad, através de seu primo e genro Ali e sua filha Fátima, são os legítimos líderes dos muçulmanos, conhecidos como Imames.
Esta introdução ao Islam xiita explorará suas raízes históricas, enfatizando a controvérsia sucessória que deu origem à divisão entre sunitas e xiitas, além de discutir as crenças, práticas, e a importância dos Doze Imames na fé xiita.
Também abordaremos como o xiismo influenciou a política, a sociedade e a cultura em países onde é predominante, como Irã, Iraque, Líbano, e outras partes do Oriente Médio.
O evento de Mubahala é o primeiro marco significativo na história islâmica onde surgem as raízes da crença xiita.
Ele, ocorreu no 24º dia do mês islâmico de Dhu al-Hijjah, no ano 10 AH (631 d.C.), de acordo com a maioria das tradições islâmicas.
Mubahala foi um desafio divino de maldição mútua entre o Profeta Muhammad e uma delegação de cristãos de Najran, que discordavam sobre a natureza de Jesus Cristo.
Os cristãos de Najran, uma região no sul da atual Arábia Saudita, visitaram Medina para discutir suas diferenças teológicas com Muhammad.
O ponto central da discórdia central era a natureza de Jesus: os muçulmanos afirmavam que ele era um humano e um profeta, enquanto os cristãos sustentavam sua divindade.
Quando as discussões não levaram a um consenso, Muhammad recebeu uma revelação divina (registrada no Alcorão, Surata 3:61), que propunha um encontro de maldição mútua, ou Mubahala, onde ambas as partes invocariam a maldição de Deus sobre os mentirosos.
No dia marcado para a Mubahala, Muhammad apareceu com Ali, Fátima, Hassan e Hussein - referidos coletivamente como Ahl al-Kisa (As Pessoas do Manto).
A presença dessas figuras centrais, que eram os membros mais próximos e queridos da família de Muhammad, destacava a seriedade e a pureza de sua intenção.
Confrontados com a firmeza e a fé demonstradas por Muhammad e sua família, os cristãos de Najran optaram por não prosseguir com a Mubahala, escolhendo em vez disso fazer um acordo com os muçulmanos.
A inclusão de Ali e seus filhos no evento reafirma sua posição central na comunidade muçulmana e sua proximidade especial com Muhammad.
Isso é interpretado como um endosso divino de sua liderança e uma prova de sua superioridade moral e espiritual.
Cerca de um ano depois, outro evento reafirmou, para muitos muçulanos, o status elevado de Ali e dos familiares do Profeta perante os outros companheiros.
Após a peregrinação de despedida (Hajjat al-Wida), a última peregrinação realizada pelo Profeta Muhammad, ele se dirigiu com seus seguidores de Meca para Medina.
Diante dessa assembleia, Muhammad proferiu um sermão onde ele segurou a mão de Ali ibn Abi Talib, seu primo e genro, e declarou: "Para quem eu sou Mawla (protetor, líder, mestre), Ali também é seu Mawla."
Este pronunciamento é interpretado pelos xiitas como a designação explícita de Ali como seu sucessor imediato e líder espiritual e político da comunidade muçulmana após sua morte.
Os sunitas, por outro lado, tendem a interpretar o termo "Mawla" de forma mais ampla, como significando "amigo" ou "aliado", e não necessariamente como uma indicação de sucessão política ou espiritual.
Para eles, este evento enfatiza a importância e a estima que Muhammad tinha por Ali, mas não constitui uma designação explícita de liderança.
Este ponto de vista prevaleceu, e Abu Bakr se tornou califa, seguido por Omar, Uthman e, finalmente, Ali.
Neste contexto, o xiitas surgem primeiramente como uma corrente política, mas como veremos a seguir, desenvolverá uma religiosidade com elementos distintos das outras denominações islâmicas.
Ali é assassinado em 661 d.c após um governo em que os muçulmanos estavam profundamente divididos por conflitos e disputas. Ele foi sucedido por Muawiyah e, posteriormente pelo seu filho, Yazid.
Este foi um grande tirano que provocou divisões profundas entre a comunidade islâmica, cujo legado é marcado pelas violações dos direitos e deveres religiosos.
Por causa disso, Hussein, neto do Profeta Muhammad, recusou-se a jurar lealdade a Yazid, acreditando que tal ato seria uma traição aos princípios do Islam.
Em 10 de Muharram, Hussein e seus 72 companheiros foram mortos em uma batalha desigual, após terem sido privados de água e recursos durante vários dias.
As mulheres e crianças sobreviventes de sua família foram levadas como prisioneiras para Damasco, a capital do califado.
Este evento foi um catalizador para transformar os partidários de Ali, não mais apenas em um ramo político, mas agora religioso.
Os partidários de Ali passam a considerar a autoridade política e religiosa vindo apenas da família de Muhammad, enfatizada principalmente na figura do imam, considerada a autoridade herdeira do Profeta.
O Xiismo é diverso, com várias correntes, como os Duodecimanos (Ithna Ashariyya), Ismailis e Zaidis, cada uma com suas próprias nuances em crenças e práticas.
No entanto, o conceito de Imamato e a ênfase na liderança da família do profeta unem os xiitas em sua fé distinta dentro do Islam.
O conceito de Imamato é um pilar central da fé e teologia xiitas. Este princípio refere-se à crença na liderança divinamente ordenada de uma sucessão de imames.
A maior parte dos xiitas os consideram infalíveis e divinamente inspirados. Além disso, eles são os únicos legítimos líderes espirituais e temporais da comunidade muçulmana após a morte do Profeta Muhammad.
Essa nomeação é vista como uma indicação de sua infalibilidade e autoridade divina para liderar a comunidade.
Essa infalibilidade é vista como necessária para garantir a pureza e a autenticidade da orientação espiritual e religiosa que eles fornecem.
Esse conhecimento é considerado um dom de Deus, permitindo-lhes guiar a comunidade de acordo com a verdadeira essência do Islam.
Os Imames são vistos como os únicos guias legítimos, cuja orientação é essencial para a manutenção da fé e prática islâmicas corretas.
Dentro do Xiismo, existem várias ramificações que diferem em suas crenças específicas sobre o número de Imames e outros aspectos do Imamato:
A maior vertente do Xiismo, mais conhecida por ser a vertente hegemônica no Irã, Líbano, Iraque e outros.
Eles acreditam em uma sucessão de doze Imames, começando com Ali ibn Abi Talib e terminando com Muhammad al-Mahdi, o décimo segundo Imam, que está em ocultação e se acredita que retornará como o Mahdi para estabelecer justiça e paz.
Os xiitas acreditam que ele entrou em um período de ocultação menor no ano 873 d.C., após a morte de seu pai, o Imam Hasan al-Askari.
Após esse período, ele entrou na ocultação maior, durante a qual sua comunicação com seus seguidores é feita por meio de emissários ou representantes especiais.
Os duodecimanos acreditam que o Imam Mahdi ainda vive, mas está oculto e retornará no final dos tempos como o Mahdi, para estabelecer justiça, erradicar a opressão e difundir a verdadeira fé islâmica em todo o mundo.
De acordo com esta crença, ele entrou em um período de ocultação menor no ano 873 d.C., após a morte de seu pai, o Imam Hasan al-Askari.
Após esse período, ele entrou na ocultação maior, durante a qual sua comunicação com seus seguidores é feita por meio de emissários ou representantes especiais. Os duodecimanos acreditam que o Imam Mahdi ainda vive, mas está oculto e retornará no final dos tempos como o Mahdi, para erradicar a opressão e difundir a verdadeira fé islâmica em todo o mundo.
A jurisprudência xiita (fiqh) é baseada no Alcorão, na Sunnah (tradições do Profeta e dos Imames), no consenso dos juristas xiitas (ijma).
As práticas religiosas e rituais, como a oração, o jejum e a peregrinação, são semelhantes às dos sunitas, mas com algumas diferenças específicas na execução e no entendimento teológico.
Os doze Imames reconhecidos pelo xiismo duodecimano são:
Os Ismailis são nomeados em homenagem a Ismail ibn Jafar, a quem consideram o sétimo Imam legítimo, em contraste com os Duodecimanos, que reconhecem Musa al-Kadhim, o irmão mais novo de Ismail, como o sétimo Imam.
Esta divergência ocorreu após a morte de Jafar al-Sadiq, o sexto Imam, em 765 d.C., levando a uma cisão na comunidade xiita.
Eles acreditam que o Imam é não apenas um líder espiritual e temporal, mas também a manifestação da luz divina e a principal fonte de conhecimento religioso.
Um dos períodos mais notáveis na história ismaili é a fundação e expansão do Califado Fatímida (909-1171 d.C.), uma dinastia ismaili que estabeleceu um império poderoso centrado no Egito.
Os ismailis, especialmente durante o período fatímida (séculos X a XII), integraram conceitos neoplatônicos em sua teologia, tentando harmonizar a revelação islâmica com a filosofia grega.
Eles adotaram uma visão hierárquica do universo e da existência, na qual Deus está no ápice, seguido por uma série de emanações ou níveis de realidade.
Essa cosmologia reflete a influência neoplatônica, com Deus sendo a fonte última de toda a existência, de onde tudo emana e para onde tudo retorna.
Após a morte do Califa Fatímida al-Mustansir Billah em 1094 d.C., a comunidade ismaili se dividiu novamente em dois grupos principais: os Nizaris e os Mustalis.
Ainda possui uma comunidade expressiva em alguns lugares da Ásia, especialmente no Tajiquistão, Paquistão e Índia.
O ramo Zaidi deve seu nome a Zaid ibn Ali, o bisneto de Ali ibn Abi Talib e Fátima, filha do Profeta Muhammad.
Zaid ibn Ali liderou uma revolta contra o Califado Omíada no século VIII, buscando estabelecer a justiça e restaurar a liderança da comunidade muçulmana aos descendentes de Ali, conforme ele acreditava ser o correto.
Sua recusa em reconhecer os califas anteriores que não eram de sua linhagem e sua ênfase na necessidade de um Imam que se levantasse contra a opressão e a injustiça, mesmo que isso exigisse rebelião armada, são características centrais que definem a seita Zaidi.
Os Zaidis possuem uma teologia e jurisprudência que, em muitos aspectos, são mais próximas das dos muçulmanos sunitas do que das de outros grupos xiitas.
Eles rejeitam a noção de infalibilidade dos Imames, uma crença fundamental entre os Duodecimanos e os Ismailis, e não compartilham da crença na ocultação do último Imam. Em vez disso, os Zaidis enfatizam que qualquer descendente qualificado de Hassan e Hussein, filhos de Ali e Fátima, tem o direito de ser Imam se ele se manifestar (se levantar em revolta pela justiça), possuir conhecimento religioso suficiente e demonstrar piedade.
Historicamente, os Zaidis estabeleceram um estado no Iêmen, que durou até o século XX, e continuam sendo predominantes nessa região, especialmente no norte do país.
Não. Xiismo ou sunismo não tem a ver com o nível de aderência da fé da pessoa, mas sim quem ela julga ser o legítimo sucessor do Profeta Muhammad, Ali (no caso dos xiitas) ou Abu Bakr (no caso dos sunitas).
Se um xiita é fanático ou não, isso não tem a ver com a sua religião, mas com o caráter dela.
Para resumir brevemente, podemos dizer que os xiitas acreditam que a sucessão do Profeta Muhammad é por meio de uma linhagem de sangue.
Já os sunitas acreditam que a sucessão é estabelecida por meio do consenso da comunidade islâmica após a morte do Profeta, ou seja, a vontade dos que nomearam os governantes vale mais do que a linhagem de sangue.
O Xiismo constitui a segunda maior corrente do Islam, abrangendo uma diversidade de tradições que incluem os Duodecimanos, Ismailis e Zaidis.
Trata-se de uma vertente criada em torno da figura de Ali, o qual eles concordam ser o primeiro sucessor político e religioso do Profeta, mas é a partir da Batalha de Karbala e da morte do Imam Hussein que este ramo ganha autonomia e começa a sistematizar a sua fé.
Esta se distingue pelo seu enfoque particular no Imamato, ou seja, a liderança espiritual e temporal, que é vista como uma sucessão divinamente ordenada a partir do Profeta Muhammad, através de sua família e descendentes diretos.
No núcleo do Xiismo está a crença na autoridade e na infalibilidade dos Imames, que são considerados por seus seguidores como líderes espirituais divinamente guiados, além da aderência ao Alcorão e à tradição profética.
A Equipe de Redação do Iqara Islam é multidisciplinar e composta por especialistas na Religião Islâmica, profissionais da área de Marketing, Ilustração/Design, História, Administração, Tradutores Especializados (Árabe e Inglês). Acesse nosso Quem Somos.