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Como o Islam Lida com a Liberdade Sexual

A liberdade sexual é fundamentada na busca pelo prazer sem que a moralidade interfira nisso, enquanto o Islam percebe a questão de modo diferente.
  • A premissa da liberdade sexual no ocidente é de que os humanos têm o direito de buscar formar sua identidade sem serem influenciados por valores externos.
  • Isso significa que, através dessa lógica, uma pessoa não deve ser obrigada a formar sua sexualidade com base em valores religiosos.
  • O Islam coloca normas de conduta para a conduta sexual de qualquer muçulmano, pois as relações geram impactos em toda a sociedade.
  • Por mais que a religião tolere em alguma medida que as pessoas cometam pecados, estes não devem ser naturalizados ou tomados como bons exemplos.

Desde a formulação do Islam como uma religião, a forma como os muçulmanos percebem o sexo sempre soou estranha para o Ocidente. 

Se na antiguidade os ocidentais enxergavam problemas com a poligenia, contracepção, divórcio e um paraíso repleto de prazeres sensoriais, a separação entre estado e igreja não aproximou o Islam do ocidente contemporâneo - ao contrário, parece ter afastado ainda mais.

A poligenia ainda continua sendo vista como um problema. Mas, agora, outras questões vêm à tona, como a segregação de gênero, a falta de liberdade sexual aos LGBTQIA+ e a instituição do casamento vista como algo patriarcal.

Na concepção progressista da história, vincular as relações sexuais ao casamento garantiria pouca liberdade às pessoas e, portanto, a emancipação sexual seria uma marca das sociedades mais socialmente desenvolvidas e livres. 

Nesta percepção, os costumes islâmicos são vistos como atrasados, pois não admitem que pessoas tenham relações sexuais fora do casamento, limitam a quantidade de parceiros e não permitem o casamento com uma pessoa do mesmo sexo.

Mas cabe neste texto investigar se o Islam está atrasado ou se o Ocidente se descolou demais do restante das culturas globais a ponto de ignorar as consequências de sua autointitulada "liberdade sexual".

A Sexualidade no Ocidente Contemporâneo

A forma como o Ocidente lida com a sexualidade não é, de forma alguma, obra do acaso ou da sobreposição de uma percepção superior em relação a outra inferior.

É fruto de lentas transformações que resultam de necessidades políticas e sociais que foram enfrentadas em determinados períodos e influenciaram a percepção das pessoas.

Essas percepções, por sua vez, acabaram permitindo que novos costumes pudessem surgir.

Ou seja, a sexualidade percebida pelo Ocidente é fruto das interações sociais, que são baseadas nas necessidades e percepções de alguns grupos de pessoas.

O desenvolvimento desse pensamento pode ser observado nas obras dos principais intelectuais do Ocidente moderno, cujas bases são anteriores à própria liberdade sexual.

Isso porque, antes de perceber a própria sexualidade, o indivíduo no Ocidente passou por uma profunda ressignificação do seu próprio ser.

Mudanças na individualidade ocidental moderna

É impossível falar de qualquer pensamento do Ocidente moderno sem falar de René Descartes (1596-1650) e o seu método de busca pela verdade baseado no ceticismo.

Para ele, qualquer ideia poderia ser colocada em dúvida. No entanto, ele acreditava que a certeza, por sua vez, seria alcançada por meio da dedução e da percepção.

É daí que se origina a sua máxima "penso, logo existo" que, para Descartes, é a prova de sua existência - afinal, se ele pensou, implica que alguém está pensando e isso, por si só, evidencia que este alguém é real.

O pensamento de Descartes deu início a uma grande revolução antropocêntrica, ou seja, o humano passou a se perceber como um agente dotado de razão autônoma que buscaria a verdade ao seu modo.

Essa individualização tomaria dimensões políticas através do pensamento de Jean Jacques Rousseau (1712-1778).

Ele acreditava que o estado natural e primitivo do ser humano era sem lei ou moralidade e, à medida que as sociedades começaram a desenvolver a propriedade privada e a divisão do trabalho, surgiu a demanda pela criação de instituições legais.

Neste período degenerado, Rousseau observou que enquanto os humanos entravam em competição entre si, também se tornavam mais dependentes uns dos outros, fazendo uma dupla pressão entre arriscar a sobrevivência ou a liberdade.

Para ele, a solução seria o contrato social, que garantiria liberdade sem colocar em risco a segurança. Afinal, as pessoas não se submetem às vontades alheias, mas às leis que elas mesmas criaram.

A vontade geral, portanto, não exigiria que o indivíduo sacrificasse a sua vontade individual, pois ela própria seria um mecanismo para governar.

E, para garantir essa liberdade, os homens deveriam ter o compromisso com o bem geral, pois isso garantiria que essa sociedade teria sucesso em se manter.

Portanto, para Rousseau, a influência da sociedade sobre as vontades do indivíduo caracteriza uma corrupção do seu estado natural. Este pensamento estaria na base da formulação do Iluminismo.

Tanto Descartes quanto Rousseau influenciaram as noções de liberdade humana, associando esta condição à autenticidade, ou seja, o humano só é livre se não estiver sob a influência da vontade alheia.

A religiosidade encarada como um mecanismo de repressão e manipulação

Na esteira do desenvolvimento do progressismo, Karl Marx (1818-1883) enxergou a história através do seu materialismo histórico e dialético. 

Ou seja, as sociedades poderiam ser entendidas através das relações materiais de produção presentes nelas. 

Em outras palavras, os aspectos materiais de uma sociedade, em última instância, explicam os seus fenômenos.

Nesta configuração, a religiosidade é alienadora, pois depositar a esperança das soluções dos problemas no pós-vida não conduziria à revolução do proletariado.

A nível histórico, Marx observa que, a nível histórico e político, as religiões, de modo geral, são aliadas da classe dominante.

O questionamento da autoridade religiosa não se inicia com Marx, tampouco ele foi o único de seu tempo a fazê-lo, mas seu método foi muito importante para que as ideologias progressistas percebessem a religião como um mecanismo opressor.

Friedrich Nietzsche (1844-1900) também observou algo paralelo em "A Genealogia da Moral", desconstruindo a ideia de uma moral universal que as religiões afirmam ser entregue diretamente por Deus e dizendo que isso é criação humana.

Segundo ele, há duas morais, a do senhor e dos escravos:

  • Moralidade do senhor: está associada às coisas boas que trazem felicidade, como riqueza, força, saúde, poder, etc.
  • Moralidade do escravo: é uma reação à moralidade do senhor e está ligada à caridade, piedade, moderação, mansidão e submissão, etc.

Ele alega que a moralidade do escravo, que era a moral religiosa, afastou o homem de sua natureza e, quando os homens não se envergonhavam de seus instintos, a humanidade era muito mais feliz do que no período pessimista que ele dizia haver em sua época.

Nietzsche conclui que a repressão dos instintos gera a culpa e a má consciência e que a moralidade deve ser deixada para as massas, mas os excepcionais não deveriam se envergonhar diante dela, e sim seguirem sua própria "lei interior".

Com isso, a renúncia da religiosidade entre o século XIX e o século XX passa a estar cada vez mais associada à ideia de o homem se tornar o seu próprio mestre, emancipado e até mesmo livre de uma opressão social que lhe foi imposta.

A liberdade sexual como parte inseparável da identidade

Usando uma abordagem acerca da moral muito parecida com a de Nietzsche, Freud (1856-1939) lançou as principais bases para o autoconhecimento da sexualidade.

Freud argumenta que a moralidade tem um papel importante na repressão do indivíduo e que isso gera um acúmulo de tensão que é o superego.

Esse superego cumpre a função de censurar as vontades humanas e a identidade mais primitiva.

Freud defende que a forma mais eficiente de lidar com qualquer tipo de desejo não é por meio da repressão, pois isso, por si só, não extinguiria o desejo, mas faria com que ele ficasse encastelado dentro do superego.

A solução seria canalizar o desejo para que ele fosse expressado de outra forma mais saudável, evitando uma expressão indiscriminada e sem nenhum limite.

Freud viu que a tensão e o prazer sexual têm uma importância fundamental para a formação do comportamento e identidade do indivíduo.

O pensamento de Freud lançou as bases para outros intelectuais que enxergam a repressão sexual como algo prejudicial, o que seria o princípio de uma longa revolução sexual.

Influenciado por Marx e Freud, o psiquiatra Wilhelm Reich (1897-1957) cunhou o termo "revolução sexual" ao escrever o livro que carrega este mesmo nome.

Para ele, as neuroses sexuais derivam da insatisfação da sexualidade natural. Esta seria suprimida pelo estado autoritário baseado na família patriarcal, na qual o pai é a autoridade do lar, do mesmo modo que o estado.

Entre os mecanismos do estado autoritário para reprimir a sexualidade natural, Reich destaca:

  • O casamento monogâmico e vitalício como um dever;
  • A supressão da sexualidade infantil, que para Reich seria a base dos desejos sexuais anormais e outras perversões que a pessoa desenvolveria ao longo da vida;
  • Falta de educação sexual e de liberdade sexual para os adolescentes;
  • Perseguição das formas de sexualidade vistas como anormais;
  • Ilegalidade do aborto;
  • A legalidade do casamento como instituição.

Reich influenciaria muitos outros intelectuais posteriores e não é difícil perceber que o seu pensamento está presente nas abordagens de qualquer ativismo por mais liberdade sexual.

Atualmente, a sexualidade é vista como parte indissociável da identidade de qualquer indivíduo e a maioria das pessoas entendem que se posicionar contra a forma de expressão da sexualidade de alguém é o mesmo que ser contra a identidade dessa pessoa.

Na esfera política, defender o direito das pessoas de se expressarem sexualmente equivale a defender direitos humanos básicos, o que, na concepção ocidental, é um pilar fundamental para a justiça.

A identidade sexual como forma de luta contra as estruturas conservadoras

A liberdade sexual passa, por fim, a orientar as relações humanas nos conformes da modernidade.

Ela influencia a segunda onda do feminismo, o avanço da indústria pornográfica e erótica, o movimento LGBTQIA+ e a não-monogamia política, entre vários outros que percebem o casamento e a família como uma instituição patriarcal.

A partir do século XX, as relações sexuais deixam de estar atreladas ao casamento e as pessoas são desobrigadas a seguir convenções referentes ao seu próprio gênero.

Diminui-se a pressão sobre os homens de perseguir ideais de masculinidade como o casamento, a paternidade e o papel de provedor e chefe de sua família.

Também é reduzida a pressão sobre a mulher pela busca da maternidade, castidade e papel de dona do lar. Elas passam a trabalhar fora e começam a ter acesso aos métodos contraceptivos, o que garante maior controle sobre a reprodução.

Em um momento posterior, homens e mulheres não são sequer obrigados a formar uma identidade correspondente ao seu próprio gênero, podendo aderir a condutas do sexo oposto.

Cada um desses aspectos citados avançou na medida em que as convenções anteriores passaram a ser percebidas como coisas do passado. Dessa forma, tentar mantê-las seria visto como uma forma de conservadorismo.

Assim, a lógica religiosa baseada nesses costumes passou a ser percebida, dentro desta lógica, como algo superado e, em última instância, que deve se limitar ao campo pessoal e não mais deve ser imposta às pessoas. 

A Oposição Islâmica à Liberdade Sexual

Principais bases para a conduta sexual islâmica

O Islam atribui papéis de gênero ao colocar o homem como provedor financeiro e emocional de sua família e a mulher como cuidadora daquilo que é parte dessa unidade.

"Os homens são responsáveis ​​por proteger e zelar por suas mulheres. Isso se deve ao fato de que Deus concedeu superioridades a cada um deles que não existem no outro e os homens despendem de suas riquezas (para suas mulheres)." (Alcorão, 4:34)

Por apresentar uma distribuição de papéis de gênero muito bem delineada, o Islam proíbe que homens se comportem propositalmente como mulheres e vice-versa:

"O Mensageiro de Allah (que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele) amaldiçoou o homem que usa roupas femininas e a mulher que usa roupas masculinas." (Abu Dawud 4098)

O casamento é o pilar fundamental da vida sexual e tem o objetivo de gerar paz e afeto mútuo entre os cônjuges, prevenir contra a fornicação, gerar filhos e, através de bons atos para com a família, agradar a Allah.

O homem pode ter até quatro esposas, desde que consiga garantir moradia, comida, roupas e bem estar a todas elas e às suas proles, enquanto a esposa pode ter apenas um marido a fim de garantir a patrilinearidade legítima.

"Se temeis não tratar equitativo em relação aos órfãos, esposai (outras) duas, três ou quatro das mulheres que vos aprouver. Se temeis não tratar justo entre elas, esposai uma só." (Alcorão, 4:3)

O matrimônio deve ser contraído apenas entre um homem e uma mulher. Ambos devem ser maiores de idade segundo as leis ou normas da sociedade que vivem e não podem ser parentes próximos.

Os filhos deste casal têm direito a ser sustentados, educados nos conformes religiosos e receber herança, caso haja, e, portanto, precisam ter clareza sobre quem é o próprio pai e mãe - o que seria difícil e, em muitos casos, impossível, se as mulheres tivessem mais de um parceiro.

Métodos contraceptivos são permitidos desde que não gerem infertilidade. Já o aborto é um assunto muito controverso com interpretações favoráveis e contrárias, mas não aconselháveis.

Opiniões favoráveis ao aborto, no entanto, sempre estarão restritas ao primeiro trimestre gestação e o ato não pode ser feito de forma irrestrita; apenas em algumas situações.

Os juristas que defendem a permissibilidade do aborto podem restringir a prática a alguma das situações abaixo:

  • A gravidez oferece risco à vida da mãe;
  • Bebês frutos de estupros;
  • Malformações fetais graves que podem comprometer severamente a saúde do bebê ao nascer.

O casamento no Islam não é um sacramento e, portanto, sua instituição é baseada em fins práticos e objetivos. 

Os humanos têm direito ao sexo e ao afeto, desde que isso não prejudique ou coloque as pessoas envolvidas e terceiros em risco.

Fornicação e sua cadeia de eventos 

Por mais que os intelectuais ocidentais tentem desvincular o sexo da unidade familiar - isto é, defender a fornicação - é impossível separar o ato de suas consequências.

Por mais que o sexo seja altamente prazeroso para o ser humano, isso não é o bastante para anular os riscos que ele oferece. 

Sobre a fornicação, o Alcorão diz:

"Nem se aproxime da fornicação/adultério: pois é uma (ação) vergonhosa e um mal, abrir o caminho (para outros males)." (Alcorão, 17:32)

Os outros males são as doenças, irresponsabilidade afetiva, degradação humana (sobretudo a objetificação das mulheres), filhos ilegítimos e a vulnerabilidade social a que mães com bebês não planejados estão sujeitas.

Disse o Profeta Muhammad: "A depravação sexual não surge entre um povo, a ponto de se tornar pública, sem que eles sejam afligidos por doenças que seus predecessores não testemunharam." (Ibn Maajah: 4019)

Junto com a maior liberdade sexual, surgiram novos recursos para tentar contornar os problemas causados pela fornicação. 

Mas, ironicamente, à medida em que a sociedade aprofunda sua busca pelo prazer humano, mais os problemas se agravam:

Novas doenças surgem, as pessoas tratam relacionamentos de forma fútil e irresponsável, crianças fruto dessas relações estão cada vez mais desamparadas e o aborto, mesmo sendo algo extremo é visto cada vez mais como uma solução banal para esses problemas.

A conduta sexual no âmbito particular

A sharia estabelece penas para dois crimes relacionados à condutas sexuais: zina (fornicação) e liwat (sodomia).

As penas podem variar: caso a pessoa não seja casada ou seja menor de idade, ficará restrita a chibatadas, mas podem ser agravadas para execução se o culpado for casado.

As penas capitais, no entanto, raramente foram aplicadas ao longo da história, pois a lei islâmica tem como precedente evitar ao máximo as execuções, com base em alguns exemplos do Profeta Muhammad.

São exigidas quatro testemunhas de um ato sexual ilícito para que a pena seja cumprida e, mesmo se tiverem visto pessoalmente o que ocorreu, elas não são obrigadas a falar o que assistiram.

Isso torna o flagrante bem difícil de acontecer, a não ser que a fornicação tenha sido feita em público. 

"E àqueles que difamarem as mulheres castas, sem apresentarem quatro testemunhas, infligi-lhes oitenta vergastadas e nunca mais aceiteis os seus testemunhos, porque são depravados." (Alcorão, 24:4)

Outra maneira de executar a pena de morte é por meio de confissão, porém, um acusado não é obrigado a confessar o seu crime e Allah poderá perdoá-lo, se seu arrependimento for sincero.

No caso abaixo, um homem pediu para ser executado por fornicar, mas o Profeta não quis aplicar a pena. No entanto, o homem insistiu até que isso fosse feito:

“Maiz bin Malik veio ao Profeta e disse: 'Eu cometi fornicação', e ele (o Profeta) se afastou dele. Ele disse: ‘Eu cometi fornicação’, e o Profeta se afastou dele. Então, ele disse: Eu cometi fornicação, e o Profeta se afastou dele, até que quando confessou quatro vezes, o Profeta ordenou que fosse apedrejado. Ao ser atingido pelas pedras, ele fugiu, mas um homem que tinha na mão uma queixada de camelo  o alcançou; atingiu-o e ele caiu. O Profeta foi informado de como ele fugiu quando as pedras o atingiram e disse: 'Por que você não o deixou em paz?'” (Sunan Ibn Majah 2554)

A partir desse relato, os juristas islâmicos interpretaram que, se o condenado retirar sua confissão antes da execução, deverá ser solto, pois o arrependimento nesses casos é o suficiente para o perdão de Allah.

Em outro relato, o Profeta diz que um homem que se vestia como mulher, ou seja, um transgênero, não deveria ser executado:

“Um afeminado que pintava suas mãos e pés de rena foi trazido ao Profeta. Ele perguntou: “Qual é o problema deste homem?”, e responderam: “Mensageiro de Allah, ele imita a aparência das mulheres!” Então ele deu a ordem para que o homem se mudasse para an-Naqi (uma região próxima de Medina). As pessoas indagaram: “Mensageiro de Allah! Não deveríamos tê-lo matado?, e ele respondeu: “Proibi que matassem pessoas que oram.” (Sunan Abi Dawud 4928)

Isso também vale para o caso dos homossexuais que não são flagrados cometendo fornicação ou sexo anal por quatro testemunhas. 

O mero fato de alguém sentir atração pelo mesmo sexo ou por alguém que não seja seu cônjuge não configura crime pela lei islâmica.

Sequer é crime que duas pessoas do mesmo sexo fiquem a sós em um mesmo ambiente e não é pemitido que os outros espionem o que elas estão fazendo:

"Ó fiéis, não entreis em casa alguma além da vossa, a menos que peçais permissão e saudeis os seus moradores. Isso é preferível para vós; quiçá, assim, mediteis." (Alcorão, 24:27)

Disse o Profeta Muhammad:

"Evitem suspeitas, pois a suspeita é a mentira mais grave na conversa e não sejam curiosos uns sobre os outros, não espionem uns aos outros, não sintam inveja um do outro e não alimentem malícia, e não alimentem aversão e hostilidade uns contra os outros. E sejam irmãos e servos de Allah."(Sahih Muslim 2563)

Como os muçulmanos lidam com a conduta sexual de não-muçulmanos

A conduta moral dos não-muçulmanos deve ser tratada de acordo com a religião em que eles se baseiam; se é autorizado algum comportamento que o Islam condena, não cabe aos muçulmanos fazerem julgamentos.

Desde a Constituição de Medina, elaborada pelo Profeta Muhammad, o estado islâmico garante a autonomia de outras religiões de manterem seus costumes.

Quanto à sexualidade, um exemplo pode ser observado através do que relata o historiador americano Johnatan A. C. Brown:

"Na civilização islâmica clássica, autoridades muçulmanas permitiam que zoroastristas se envolvessem em casamentos incestuosos de irmão com irmã".

Isso não significa que o muçulmano deva defender um direito que contrarie a sharia apenas pelo fato de que a lei islâmica respeita a autonomia dos não-muçulmanos, mas há um precedente de não interferir em questões de outras sociedades.

Como e por que então o Islam se opõe à liberdade sexual?

Embora o Islam imponha punições a quem desrespeita suas condutas sexuais, também há uma tendência de perdoar aqueles que cometem essas transgressões.

A principal razão para isso é que a sharia não é um simples código penal, mas, principalmente, uma orientação para as pessoas que a seguem.

Portanto, as condutas sexuais que prejudicam a saúde, o caráter e o meio social devem ser desencorajadas, e isso é muito mais importante do que punir.

Além disso, deve-se haver uma determinada tolerância com os pecados alheios, pois nem todas as pessoas serão capazes de formar uma identidade sexual capaz de resistir a todas as tentações que lhes ocorrerem.

É impossível esperar que as pessoas não pequem ou que tenham uma natureza perfeita para qualquer assunto, incluindo a sexualidade.

O sexo no Islam é um assunto particular e as pessoas não são encorajadas a demonstrar afeto romântico em público, mesmo que a relação seja lícita.

A modéstia é um valor importante. Portanto, se a pessoa mantiver relações sexuais ilícitas, é importante que busque se arrepender, mas também que evite falar sobre seus pecados publicamente.

Deus não aprecia que sejam proferidas palavras maldosas publicamente, salvo por alguém que tenha sido injustiçado; sabei que Deus é Oniouvinte, Onisciente. (Alcorão, 4:148)

No entanto, respeitar essa individualidade não dá a ninguém o direito de relativizar a moral e as consequências catastróficas causadas pela expressão da sexualidade com poucas ou nenhuma regra.

É fato observável que o humano é limitado e não pode prever todas as consequências de suas ações e, em algumas situações, sequer leva em consideração os malefícios de seus atos.

E se o humano não consegue prever ou não se importa com a consequência dos seus atos, é claro que a medida de uma norma social não deve ser a satisfação pessoal e o egoísmo, mas sim aquilo que é melhor para a saúde e a conservação da sociedade.

Bases Materiais Para as Condutas Sexuais Religiosas

Como dissemos, as condutas sexuais no Islam não são formas moralistas de reprimir o prazer, afinal, isso não é algo imoral dentro da revelação sagrada.

O problema de expressar a sexualidade sem regras que protejam a saúde, a conservação da família e da sociedade é meramente prático e isso pode ser entendido através de dados estatísticos:

  • O Ministério da Saúde do Brasil e o IBGE apontaram que cerca de 1 milhão de pessoas afirmaram ter algum diagnóstico de ISTs apenas em 2019. Isso corresponde a 0,6% da população adulta do país.
  • O Ministério da Saúde cita: "As ISTs estão entre os problemas de saúde de maior impacto sobre os sistemas públicos de saúde e sobre a qualidade de vida das pessoas no Brasil e no mundo".
  • No último boletim epidemiológico do HIV/Aids, divulgado em 2022 pelo Ministério da Saúde, constatou-se que, entre julho de 2010 até 2022, foram notificados 2.755 casos de HIV/Aids em menores de 15 anos.
  • Entre os casos notificados em indivíduos acima de 13 anos entre 2007 e 2022, 44,4% eram homossexuais, 8,2% eram bissexuais e 30,4% eram heterossexuais.
  • De acordo com o relatório da UNICEF de 2007 sobre o bem-estar das crianças nos países economicamente avançados, crianças sem pai tendem a ser mais inseguras emocionalmente e fisicamente.
  • O relatório também indica que essas crianças estão mais suscetíveis à evasão escolar, mal desempenho nos estudos, delinquência e criminalidade juvenil, gravidez precoce e abuso de álcool e drogas em relação àquelas que possuem um pai presente.
  • Essas crianças também estão mais sujeitas a ter problemas de saúde física e mental.
  • A expectativa de vida de uma criança sem pai é quatro vezes menor em relação às que possuem pai presente.
  • A pesquisa "Síntese de Indicadores Sociais - Uma análise das condições de vida da população brasileira", publicada pelo IBGE em 2018, mostrou que 56,9% das mães solos do Brasil vivem abaixo da linha da pobreza.
  • Uma pesquisa divulgada pelo site pornográfico Pornhub mostra que 64% dos visitantes são homens.
  • Há pesquisas que sugerem que os jovens começam a consumir pornografia entre 12 e 13 anos. Independentemente da precisão dos resultados, os filmes e materiais eróticos são gratuitos e de fácil acesso a qualquer pessoa, sem restrição de faixa etária.
  • Grande parte dos vídeos mostram cenas violentas, podem conter simulações de estupro e colocam pessoas (principalmente mulheres) em condições degradantes e de objetificação.

Os dados acima são apenas alguns dos impactos sociais, psicológicos e médicos dos riscos da falta de parceiros sexuais fixos, ausência de um ambiente familiar estruturado e da ausência de condutas mais contundentes ao falar e educar sobre sexo.

É fato que uma sociedade cujos valores são pautados na estruturação da família não irá zerar esses problemas, ou sequer impedir que as pessoas se expressem sexualmente apenas dentro dos limites estipulados pelas leis religiosas.

No entanto, cultuar esses valores é o mesmo que ter como referência aquilo que é ideal e que de fato pode diminuir todos esses problemas.

O Islam, enquanto uma religião que pretende gerar bem estar, não apenas no pós-vida, mas também na vida mundana, não pode de forma alguma ensinar que uma sexualidade com poucas regras tem o mesmo valor de uma vida sexual dentro do matrimônio.

Isto seria encorajar o que é nocivo ao ser humano, o que contradiz o Alcorão quando é dito: "recomenda o bem, proíbe o mal" (Alcorão, 31:17)

Para sintetizar, o sexo e a sexualidade são como um rio caudaloso: você pode ir até a sua margem para beber água diretamente dele, correndo o risco de cair, ser arrastado pela correnteza e morrer afogado, ou pode ir até ele carregando um pote, retirar apenas o que precisa e ir embora para usufruir desta água em segurança. 

O casamento é esse pote que garante que a pessoa satisfaça sua necessidade em segurança, e pode não permitir que alguém carregue toda a água que deseja, mas com certeza garantirá que a pessoa mate sua sede.

Conclusão

O sexo possui impactos fisiológicos, sociais, na formação da identidade e na saúde humana. Por isso, expressar a sexualidade com poucas regras ou nenhuma pode ser um risco para o indivíduo e para terceiros.

No Ocidente, o limite do sexo é o próprio prazer, desde que seja de forma consensual. Tais parâmetros não são suficientes para evitar as epidemias de ISTs, filhos indesejados, mães em vulnerabilidade social, abandono parental, vícios em pornografia, violência sexual e objetificação humana.

A liberdade sexual também afasta muitos homens da busca de uma identidade viril e cavalheiresca, e afasta muitas mulheres da busca de uma identidade feminina e maternal.

Para o Islam, valorizar a conduta sexual atrelada à formação da família não é um modo de impedir que as pessoas cometam pecados, pois a natureza humana é naturalmente inclinada ao pecado.

No entanto, este ideal serve para que as pessoas tenham uma referência clara do que é bom e saudável para si e busquem isso à sua maneira, se afastando daquilo que é nocivo.

O muçulmano não precisa ser preconceituoso, odiar as pessoas pela forma como se expressam e muito menos deve fechar as portas da religião para essas pessoas.

Ao contrário, deve seguir com paciência em seu caminho, buscando sempre aperfeiçoar sua conduta e, mesmo que cometa muitos pecados relacionados ao sexo, ele não deve desistir de buscar a conduta ideal, pois, mesmo que erre várias vezes, estará sempre no Islam enquanto se arrepender.

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