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A Jornada de Malcolm X ao Islam

Malcolm X até hoje é lembrado por sua luta contra o racismo, mas poucos sabem que ele se converteu ao Islam nos últimos anos de sua vida.
  • Malcolm X foi um ativista negro americano que teve sua vida dilacerada por causa do racismo e isso é algo que moldou seu discurso.
  • Ele fez parte da seita Nation of Islam que, apesar do nome, não seguia o Islam e defendia o nacionalismo e a supremacia negra.
  • Embora a maior parte do legado de Malcolm seja deste período, ele abandonou o grupo e se converteu ao Islam sunita ortodoxo no final de sua vida.
  • O Islam motivou a compaixão de Malcolm e o fez mudar sua percepção sobre a supremacia negra e a forma com que ele combatia o racismo.

 

Malcolm Little, mais conhecido como Malcolm X, foi um famoso ativista americano contra o racismo, suas ideias servem de base para boa parte dos militantes negros do ocidente, principalmente pela sua luta focada nos direitos humanos e no nacionalismo afro-americano.

Nasceu em 1925 nos EUA em uma época de extrema segregação racial e incontáveis casos de violências motivados pelo ódio aos negros.

Ficou bastante conhecido pela sua militância no grupo proto-islâmico Nation Of Islam, época em que parte importante de seu legado foi construído.

Mas o que nem todos sabem é que ao final de sua vida, Malcolm se converteu ao Islam sunita ortodoxo e isso teve um grande impacto no seu pensamento acerca dos conflitos raciais.

Por causa disso, hoje não é exagero dizer que Malcolm X foi, ao lado do lutador Muhammad Ali, dois dos muçulmanos mais famosos do ocidente.

A Vida Pregressa de Malcolm

Malcolm nasceu em Omaha, no estado americano do Nebraska. Os fatos que ocorreram na sua infância e juventude dizem muito a respeito da sua reação a respeito da condição dos negros nos EUA.

Seu próprio pai, Earl Little, foi morto pelo grupo terrorista Black Legion por meio de um crime bárbaro em que foi espancado e jogado na linha de um bonde, onde foi atropelado e mutilado, mas veio a morrer horas depois após imensa agonia.

Sua mãe, Louise Helen Norton Little, ficou responsável por cuidar dos seus oito filhos. Uma mulher negra de pele clara, que frequentemente era confundida com uma branca, mas que perdia oportunidades de emprego toda vez que sua origem era descoberta.

Ela chegou a ter outro relacionamento, mas foi abandonada quando estava grávida, um choque psicológico tão grande que levou ela a ser internada em um hospital psiquiátrico.

Na escola, ele foi desencorajado por um professor de buscar uma boa carreira profissional, pois ele nunca conseguiria ter um bom futuro pelo fato de ser negro.

A partir disso, sua  vida foi se decaindo cada vez mais, sendo que aos 15 anos ele abandonou a escola e foi viver na rua, passando a lidar com drogas, jogos de azar e prostituição, até que foi preso por assalto em residências.

Malcolm tinha 19 anos quando entrou na cadeia, no tempo em que esteve ali, ele começou a estudar por influência de outros presos que o incentivaram.

Ele fez um curso à distância de inglês e também aprendeu latim, e foi durante seus estudos que ele teve contato pela primeira vez com a doutrina da Nation Of Islam.

A Nation Of Islam

Elijah Muhammad e Malcom x.

A Nation of Islam é uma seita que contém elementos do Islam, mas não faz parte da religião. Ela afirma que a figura pré-apocalíptica e salvadora da escatologia islâmica, o Mahdi, já teria aparecido para os muçulmanos através de seu fundador Fard Muhammad.

Ele não apenas seria o redentor, mas também uma divindade entre os seguidores da seita, que pregava não apenas o nacionalismo negro, mas a supremacia dos africanos e seus descendentes.

Este ideal envolve Malcolm totalmente, que não tinha nenhuma boa experiência com pessoas brancas até aquele momento em sua vida e acreditava que eles eram maus de fato.

Ele rapidamente começa a se aprofundar nos ensinamentos da Nation of Islam (NOI) após conhecer o discurso de seu líder, Elijah Muhammad, que afirmava que os brancos são demônios.

Essa ideia estava atrelada à crença islâmica dos gênios que são criaturas descendentes de Satanás.

Um desses gênios era um cientista chamado Yaqub, que foi quem de fato seria o suposto criador da raça branca de acordo com as crenças da Nation of Islam.

Os níveis mais extremos de racismo afetava a espiritualidade da seita, que acreditava que os homens brancos eram de fato demônios e que a solução para isso um país somente para negros nos EUA até que eles pudessem retornar para a África.

É nesta época que ele deixa de se autodenominar Malcolm Little para virar Malcolm X. O X seria o espaço para seu nome de origem africana, aquele que ele acreditava ser o verdadeiro, mas que lhe foi tirado para colocar-lhe um nome europeu.

Ele também abandona todos os hábitos ruins que aprendeu nas ruas e deixa de se envolver com drogas, crimes, mulheres e apostas.

O Ativismo de Malcolm

Malcolm era uma figura cativante que envolvia muito as pessoas. Era muito inteligente, hábil com as palavras e tinha um porte físico muito elegante. Era alto, se vestia bem, além de ser um homem bonito.

Se destacou rapidamente dentro da NOI após sair da prisão, em 1952 e, até o final daquela década, ele já era considerado uma das lideranças mais importantes do ativismo negro nos EUA.

Se tornou a segunda pessoa mais importante da seita, atrás apenas do líder Elijah Muhammad.

Neste período ele criticou Martin Luther King e o movimento pelos direitos civis, pois ao contrário deste, Malcolm não acreditava na não-violência como resposta ao racismo.

Seu discurso impondo uma resistência ao preconceito, autodefesa e nacionalismo negro engajou multidões, aumentando o contingendte da NOI de 1.200 para 75.000 pessoas.

Foi responsável por fazer o pugilista Cassius Clay entrar para a seita. Esta lenda do boxe mais tarde mudou seu nome para Muhammad Ali.

O legado deixado por Malcolm X que conhecemos até hoje é fruto da mentalidade que ele tinha naquele período, mas muitos se esquecem que isso mudou muito no final de sua vida.

Desligamento da NOI

Em 1961, Malcolm e Elijah começam a ter diferenças irreconciliáveis sobre os rumos que a NOI deveria adotar.

Malcolm acreditava que o grupo deveria se aliar aos grupos ativistas pelos direitos civis, políticos negros e grupos religiosos, mas foi repreendido por Elijah.

Único encontro entre Malcolm x e Martin Luther King.

Tudo piorou ainda mais quando Malcolm descobriu que Elijah mantinha casos extraconjugais com secretárias da NOI, o que era uma transgressão às normas do grupo.

Em 1963, Malcolm disse após o assassinato do presidente americano John F. Kennedy que as galinhas voltando para o poleiro sempre o alegram, o que gerou grande comoção na sociedade americana, até mesmo por parte da NOI.

Malcom foi proibido de falar em nome do grupo e posteriormente foi desligado da seita.

A Jornada para o Islam

Depois que deixou a NOI, Malcolm se encontrou com diversos muçulmanos sunitas que viram sinceridade na sua conduta e o encorajaram a aprender mais sobre o Islam tradicional.

Em 1964 ele viaja para a Arábia Saudita, voando primeiro para Jeddah, mas com a intenção de ir para Meca e fazer o Hajj - a peregrinação obrigatória dos muçulmanos.

Acabou ficando retido algum tempo na cidade de Jeddah, pois havia uma incerteza sobre ele ser muçulmano, o que depois foi confirmado pelas autoridades. No entanto, acabou sendo convidado oficial do estado para se encontrar com o rei saudita Faisal neste ínterim.

Em seguida Malcolm foi para Meca, uma experiência que mudaria para sempre sua percepção sobre a vida e sobre os problemas raciais.

Pela primeira vez ele relata ter visto pessoas de todas as origens convivendo em harmonia em igualdade com um verdadeiro espírito de fraternidade: 

"Cada um dos milhares no aeroporto, prestes a partir para Jeddah, estava vestido dessa maneira. Você poderia ser um rei ou um camponês e ninguém saberia. Alguns personagens poderosos, que me foram apontados discretamente, usavam a mesma coisa que eu. Uma vez assim vestidos, todos nós começamos a gritar intermitentemente "Labbayka! (Allahumma) Labbayka!" (Lá vou eu, ó Senhor!) No avião estavam pessoas brancas, negras, marrons, vermelhas e amarelas, olhos azuis e cabelos loiros, e meu cabelo ruivo crespo - todos juntos, irmãos! Todos honrando o mesmo Deus, todos por sua vez dando igual honra uns aos outros…

Foi quando comecei a reavaliar o "homem branco". Foi quando comecei a perceber que "homem branco", como comumente usado, significa tez apenas secundariamente; principalmente descrevia atitudes e ações. Na América, "homem branco" significava atitudes e ações específicas em relação ao homem negro e a todos os outros homens não-brancos. Mas no mundo muçulmano, eu tinha visto que os homens de tez branca eram mais genuinamente fraternos do que qualquer outra pessoa. Aquela manhã foi o início de uma alteração radical em toda a minha visão sobre os homens "brancos".

Eram dezenas de milhares de peregrinos, de todo o mundo. Eles eram de todas as cores, de loiros de olhos azuis a africanos de pele negra. Mas estávamos todos participando do mesmo ritual exibindo um espírito de unidade e fraternidade que minhas experiências na América me levaram a acreditar que nunca poderia existir entre o branco e o não-branco...A América precisa entender o Islam, porque isso é a única religião que apaga de sua sociedade o problema racial. Ao longo de minhas viagens pelo mundo muçulmano, conheci, conversei e até comi com pessoas que na América seriam consideradas brancas - mas a atitude "branca" foi removida de suas mentes pela religião do Islam. Nunca antes vi fraternidade sincera e verdadeira praticada por todas as cores juntas, independentemente de sua cor."

Malcolm X e o rei saudita Faisal.

Após a peregrinação Malcolm mudou seu nome para El-Hajj Malik El-Shabbaz.

Depois disso ele viajou por Egito, Etiópia, Tanganica , Nigéria, Gana, Guiné, Sudão, Senegal, Libéria, Argélia e Marrocos.

O espírito de comunidade que ele conheceu nesses lugares e o amor sincero a Deus, fruto da devoção dos muçulmanos curou o ódio que ele sentia. Ele nunca deixou de lutar contra o racismo, mas também nunca mais o combateu da mesma maneira.

A partir dali, Malcolm se tornou um grande divulgador do Islam, e acreditava que a devoção sincera à religião seria capaz de solucionar o cruel problema do racismo.

Morte

Após voltar para os EUA, Malcolm se tornou temido pelo establishment americano, pois agora ele não falava mais apenas para pessoas negras que queriam reagir à violência, mas com todos que queriam dar um basta naquela situação.

Também começou a ser ameaçado constantemente pelos membros da NOI por se posicionar contra o grupo e abraçar o Islam.

Elas começaram a se tornar cada vez mais constantes e agressivas, até que Malcolm previu que, de fato, seu fim estava próximo.

Em fevereiro de 1965 ele se preparava para dar um discurso na Organização da Unidade Afro-Americana, entidade secular e pan-africana que ele havia organizado após ser expulso da Nation of Islam.

Em uma plateia de 400 pessoas, um homem gritou "tire as mãos do bolso" e quando os guarda-costas foram até ele, vários homens abriram fogo diversas vezes contra Malcolm. Ao todo, 21 disparos o acertaram.

Embora soubesse que estava prestes a morrer, Malcolm nunca fugiu ou pediu proteção policial, simplesmente aceitou a possibilidade do martírio para combater a incredulidade.

Ele voltou para Allah aos 40 anos, de acordo com o calendário islâmico, idade em que as pessoas alcançam a maturidade, a mesma em que o Profeta Muhammad começou a receber a Revelação do Alcorão.

Legado

Malcom se tornou uma figura marcante na história do ocidente pela forma que se posicionou no combate ao racismo, embora seu legado mais conhecido fosse na sua era de incredulidade, quando servia a Nation of Islam.

Mesmo assim, sua conversão não foi em vão nem para ele e nem para seu legado, longe disso. Até hoje, muitas pessoas se aproximam do Islam por causa de tudo o que ele deixou, principalmente jovens afro-americanos que buscam resgatar as raízes de seus antepassados muçulmanos.

Embora tenha sido uma figura controversa em muitos momentos, Malcolm sempre se posicionou por uma causa justa e teve a felicidade de partir deste mundo sabendo que o preconceito e a arrogância são, antes de tudo, doenças da fé e da espiritualidade.

Sob a perspectiva do Islam, toda sua trajetória é reconciliada através da sua conversão, algo que ele soube descrever muito bem na conclusão de sua biografia: 

"Se eu posso morrer tendo trazido alguma luz, tendo exposto qualquer verdade significativa que ajudará a destruir o câncer racista que é maligno no corpo da América - então, todo o crédito é devido a Allah. Só os erros foram meus."

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