Página Inicial » História Islâmica » O Grande Imam – Conheça a história de Abu Hanifa

O Grande Imam – Conheça a história de Abu Hanifa

Um gigante entre gigantes, imã Abu Hanifa (699 – 767 d.C) se eleva entre os sábios que agraciaram a história islâmica. Ele era como o sol iluminando todos os horizontes, refletindo a Luz do Profeta (Que Deus a paz e as bênçãos de Deus estejam sobre ele). Essas reflexões de luz habilitaram geração após a geração a ver a fonte originária de tal Luz . Uma grande maioria dos 1,7 bilhões de muçulmanos no mundo de hoje (em cerca de 2010 d.C) seguem a escola de Fiqh que carrega seu nome.

Al Shaykh al A’zam (o Grande Shaykh), como ele é referido por quem o admira, foi o primeiro a definir os processos que regem o usool e Fiqh (os princípios de Fiqh). Ele precedeu Imã Malik (711 – 795 d.C) por dez anos, Imã Shafi (767 – 820 d.C) por uma geração e Imam Ahmed (780 – 855 d.C) por cem anos. Imã Abu Hanifa estudou com Imã Ja’afar al-Sadiq (702 – 765 d.C). Por sua vez, os outros grandes Imames tiveram o benefício do legado do Imã Abu Hanifa quando assumiram a monumental tarefa de codificar o Fiqh.

Que o Imã Abu Hanifa foi um dos maiores do mujtahideen (plural del mujtahid, que significa, esforço intelectual, significando também, erudito, jurista, aplicado), fato que é bem conhecido. O que não se conhece é que ele também era o mestre de planejamento da cidade, responsável pelo planejamento da cidade de Bagdá quando foi fundado pelo Califa al Mansur (714 – 775 d.C) em 760 d.C. Abu Hanifa era um matemático de primeira magnitude. Ele estava ciente dos conceitos de densidade específica e volume específico e implementou-os na prática. Como filósofo, seu trabalho antecipou a dialética hegeliana em mais de mil anos. A dialética hegeliana (a qual recebeu o nome em razão de Hegel, o filósofo alemão do século XVII) é um dos princípios básicos da filosofia ocidental. Sua premissa é que uma maior verdade coletiva emerge quando várias verdades individuais competem. Olhando de outra forma, também significa que o estado é mais importante que o indivíduo. Para coroar tudo, Abu hanifa não era um eremita ou um academicista puro, que enclausurava-se em monteiros ou mesquitas. Foi um homem rico, comerciante bem-sucedido, um maravilhoso ser humano que vivia entre as pessoas comuns com entusiasmo e animação de um crente e contribuiu para a vida da comunidade que o integrava.

O rio Tigris beija o túmulo deste mujtahid enquanto serpenteia através da agora maltratada cidade de Bagdá. Localizado a aproximadamente seis quilômetros do centro da cidade, a mesquita de Abu Hanifa está localizada no distrito de Al A’zamiyah, que carrega seu nome. Seu túmulo atraiu peregrinos da Turquia, Bósnia, Ásia Central, Afeganistão, Paquistão, Índia, Bangladesh, de todo o mundo islâmico. O cemitério é antigo. Durante o período Abássida (751 a 1258 d.C), chamou-se Maqbaratul Khaysarun, que recebeu o nome da mãe do califa Harun al Rashid (763-809 d.C). São econtrados os túmulos de muitos califas abássidas e dignitários nesse cemitério.

Olhar para a mesquita de Abu Hanifa do outro lado do rio Tigris, na margem oeste, permite encontrar o túmulo de outro grande historiador, Imã Musa al Kazim. O distrito tem o nome dele e se chama Kazimiyah. Musa al Kazim (745-799d.C) foi o sétimo imã na linhagem de ahl-e-bait (em árabe: أهل البيت) refere-se no islã à família do profeta Mohammed. A palavra árabe ahl significa família e bait, casa; a expressão significa literalmente “aqueles que se reúnem sob o mesmo teto”. Muçulmanos sunitas e xiitas atribuem diferente significado e importância ao termo.) na tradição Ithna Ashari xiita. O rio Tigris divide as duas tumbas e, num símio melancólico, simboliza a divisão xiita-sunita que atravessa a história islâmica, assim como o rio Tigris através da cidade dividida de Bagdá. É dito entre os crentes de ambos os lados que os dois grandes estudiosos, Imã Abu Hanifa e Imã Musa al Kazim conversam um com o outro nas primeiras horas da manhã, lamentando a fitna xiita-sunita que engoliu Bagdá e obrigando os crentes a construírem uma ponte. A ponte foi construída conectando as duas mesquitas no início do

século XX. Os xiitas e os sunitas não podiam concordar em chamá-la de Ponte al A’azamiyah ou de Ponte al Kazimiyah. Porfim, um acordo foi alcançado e ela foi simplesmente chamada Burj al Imamiyah (a Ponte dos Imames).

A história de Imã Abu Hanifa é a história da famosa cidade de Bagdá. Com a Revolução Abássida de 750 d.C, o centro de gravidade do poder político passou do pátio árabe para a Pérsia, Khorasan e Ásia Central. Reconhecendo essa mudança no poder, o Califa al Mansur desejava mudar sua capital de Damasco, Síria. O Iraque, intercalado entre a Pérsia e o mundo árabe, era a escolha lógica. Imã Abu Hanifa foi comissionado pelo califa para localizar e planejar um sítio para a nova capital. Abu Hanifa escolheu a localização atual, em torno de uma curva do rio Tigris, prestando muita atenção à defesa e às comunicações. Para obter a concordância do califa, Abu Hanifa traçou um esboço geométrico da capital planejada, mostrando em detalhes a localização do palácio, a mesquita, o mercado, as áreas residenciais e o forte. Depois, aspergiu sementes de algodão sobre os contornos marcados. Ao selecionar uma noite sem lua quando houvesse pouca radiação de fundo, Imã Abu Hanifa incendiou as sementes de algodão. Uma das características das sementes de algodão é que elas irradiam uma luz brilhante quando são queimadas. Usando as sementes de algodão em chamas como seu guia, Imã Abu Hanifa mostrou o esboço da cidade planejada para o califa de uma torre especialmente construída para a observação na ocasião. O califa ficou satisfeito e autorizou a construção a começar.

Um grande número de tijolos foi necessário para a construção da cidade. As fábricas surgiram em todo o local selecionado, mas não houve controle de qualidade, de peso ou tamanho. Imã Abu Hanifa prescreveu que cada tijolo devia atender aos requisitos específicos de dimensões e pesos. Além disso, ele estipulava que os tijolos, uma vez entregues, fossem empilhados em pilhas cúbicas de dimensões prescritas para que o número total de tijolos em cada pilha fosse de mil. Desta forma, ele introduziu os conceitos de densidade específica e volume específico e aplicou-os em um grande projeto arquitetônico.

Abu Hanifa nasceu com o nome Nu’man bin Thabit bin Marzuban. Seu avô Marzuban era um afegão de Cabul e aceitou o Islã durante o período inicial dos Omíadas. Ao contrário da maioria dos nomes árabes, o nome de Abu Hanifa é derivado do nome de uma de suas filhas, Hanifa. O povo de Bagdá relatou que Hanifa, a filha do Imã, era bem conhecida por sua piedade e mostrou grande inteligência e sabedoria em uma idade precoce. Ela tinha sua própria halqa (aula a um circulo de estudantes) onde instruía os alunos em questões de religião. Um grupo de mulheres perguntou-lhe como tantos homens e mulheres individuais poderiam trabalhar juntos para o bem comum mesmo que tivessem suas próprias famílias separadas. Hanifa pediu a cada uma das mulheres para trazer uma xícara de leite. Tirando uma grande garrafa de cerâmica da casa de seu pai, ela colocou o leite de cada um dos copos individuais no frasco. “Agora, me diga”, ela perguntou a cada uma das senhoras, “qual parte do leite é sua”. As mulheres imediatamente entenderam que a comunidade era como o leite no frasco. O leite veio de copos diferentes, mas agora era um. À medida que a fama de Hanifa se espalhava, as pessoas começaram a se referir ao Imã como Abu Hanifa (o pai de Hanifa).

Marzuban era um comerciante bem sucedido, envolvido no comércio de seda através da antiga estrada de seda da caravana que conduzia da Índia, Afeganistão, e Ásia Central à China. Ele entrou no Islã durante o período de Khulfa e Rashideen (Período hoje conhecido como “Dos califas Bem-Guiados”, sendo os califas bem-guiados as pessoas de Abu bakr, Omar, Othman e Ali; eles realmente seguiram os passos de nosso Profeta (S.A.W) e se tornaram os sucessores depois dele (S.A.W).) e mudou-se para a cidade guarnição de Kufa, no sul do Iraque. Localizado não muito longe da cidade portuária de Abadan, a cidade de Kufa tornou-se a capital provincial do Iraque e uma cidade movimentada em troca e comércio. Marzuban prosperou como um comerciante de seda e foi aqui que Thabit, o pai de Abu Hanifa nasceu.

Thabit ibn Marzuban foi educado para ser um jovem temente a Deus. É relatado que um dia ele caminhava pelas margens do rio Tigris, e encontrou uma maçã que flutuava a jusante. Com estava com fome, pegou a maçã e comeu. Mas então o remorso se instalou. “A quem é que a maçã pertence?”, Perguntou o jovem Thabit. “Eu consumi um item sem pagar por isso. Como enfrentarei o Dia do Juízo Final por esse esquecimento?”. Ele caminhou rio acima pela margem do rio para encontrar o pomar de onde a maçã havia chegado para que ele pudesse se aproximar do dono do pomar e pedir perdão. Localizou o pomar e bateu à porta do dono que ficou espantado com a honestidade e a integridade do jovem que estava diante dele, com a cabeça inclinada, pedindo perdão. “Eu vou perdoá-lo, mas com uma condição”, disse o proprietário. “Tudo o que você propor, senhor, eu aceitarei”, disse o jovem Thabit: “Estou mesmo disposto a trabalhar para você e pagar a dívida da maçã”. “A condição, meu filho, é esta”, disse o dono, “Você deve se casar com minha filha. Ela é cega, surda e sem discernimento. Preciso de alguém para cuidar dela”. Essa era a linguagem dos Hanifas. O jovem Thabit entendeu que a filha nunca tinha visto nada censurável, ouvido algo ruim ou falado mal de qualquer um. Ele concordou de imediato.

Nu’man bin Thabit, mais tarde conhecido por seu nome universal, Imã Abu Hanifa, nasceu no ano 699 d.C ou 77 AH na cidade de Kufa. Como é comum aos homens e mulheres mais famosos da história, sua linhagem é reivindicada pelos iranianos, afegãos e árabes. Mas a maioria dos estudiosos concorda que ele era de ascendência afegã através de seu avô Marzuban. Kufa era na época uma cidade de guarnição em um período de rápida expansão do império Omíada. Era também a capital provincial e um centro comercial, um local de encontro para persas, árabes, afegãos e indianos. Tribos turcas vaguearam da Ásia Central, assim como os chineses da distante Sinkiang. Abu Hanifa tinha apenas doze anos quando Sindh e Multan foram adicionados aos domínios Omíadas através das conquistas de Mohammed bin Qasim (695 – 715 d.C.)

O que Kufa representou deixou um impacto duradouro sobre o jovem Abu Hanifa e esse impacto se reflete em seu Fiqh. “O Imã de um turco convertido é igual ao imã de um residente de Medina”, resume sua seu discurso sobre aceitação de pessoas de todas as nações e origens étnicas. Kufa era a antítese de Medina. Enquanto Medina era a cidade do Profeta (Que a paz e bênçãos de Deus estejam sobre ele), o berço da civilização islâmica, isolada das correntes convulsivas em terras longínquas, Kufa estava no centro da turbulência cultural e intelectual provocada pela mistura de zoroastros persas, budistas chineses, hindus indianos e Muçulmanos árabes. Os contextos geopolíticos e culturais das duas cidades foram diferentes. Este plano de fundo deve ser mantido em mente por estudantes de Fiqh comparado que estudam as posições das várias escolas de Fiqh em questões específicas.

Abu Hanifa, nascido em uma família mercante, aprendeu o sobre comércio de seda com seu avô. Seu treinamento inicial foi no comércio, em vez de em Sunna e Fiqh. É relatado que, quando ele tinha oito anos e estava a caminho da loja de seda de seu avô, ele foi parado por um Shaykh e foi perguntado a que madrasa (sala de aula) estava indo. O Shaykh viu a luz no rosto do jovem Abu Hanifa e o grande potencial no jovem rapaz. Quando Abu Hanifa respondeu que ele estava indo para uma loja de seda e não para uma sala de aula, então Shaykh o levou como seu aluno. O jovem Abu Hanifa fez um rápido progresso e logo superou todos os outros alunos da escola, memorizando o Alcorão, aprendendo ahadith e mergulhando no conhecimento que o melhor dos Shaykhs tinha para oferecer.

O aprendizado do jovem Shaykh Abu Hanifa logo atraiu a atenção de estudiosos, jovens e idosos assistiram a sua halqa (aula a um círculo de estudantes) e aprenderam com ele. Viajando para o Hijaz, Abu Hanifa realizou seu Hajj e passou dois anos em Medina indo a halqa do Imã Ja’afar al-Sadiq, aprendendo com ele o significado interior (místico) da Shari’ah como transmitido pelo Profeta através do ahl-e-bait. Há, no entanto, outra escola de pensamento que acredita que Imã Abu Hanifa e Imã Ja’afar al-Sadiq nunca se encontraram. No entanto, com base no hadith mutwattir (hadith contínuo) do Imã Abu Hanifa: “Se não fosse por dois anos que eu passei com Ja’afar al-Sadiq, eu ficaria vagando à

toa”, aceitamos a premissa de que o Imã Abu Hanifa realmente participou da halqa de Imã Ja’afar al-Sadiq e aprendeu ilm ul ishara (o conhecimento do que está além da percepção sensível) dele.

Imã Abu Hanifa tinha um método único de ensinar seus alunos. Em vez de lhes dar soluções para questões específicas trazidas antes para julgamento, o Imã dividiria seus alunos em dois grupos. Um grupo foi convidado a defender uma proposição, enquanto o outro foi convidado a se opor. Os alunos estudariam o Alcorão, ahadith verificados e as decisões anteriores tomadas pelos Sahaba (companheiros do Profeta), passavam a debater entre si e finalmente chegavam a um consenso. O processo foi concebido para remover qualquer probabilidade de erro no julgamento e a premissa era que uma verdade superior emerge da dialética (debate) de duas posições opostas. Mil anos depois, o mesmo processo tornou-se o alicerce da dialética hegeliana, uma escola de filosofia que recebeu o nome do filósofo alemão George Wilhelm Frederich Hegel (1770-1831). Hegel é considerado o pai da filosofia dialética no mundo ocidental. Os marxistas e os nacionalistas alemães antes da Segunda Guerra Mundial consideraram Hegel como o pai de sua ideologia.

Imã Abu Hanifa estava profundamente consciente dos desafios enfrentados pelos juristas no ambiente social dinâmico de Kufa. Os zoroastristas, os budistas, os hindus, os muçulmanos, os sabeus e os cristãos tinham sua própria visão do cosmos e sua própria maneira de se relacionar com o transcendente. Quando a conversão ao islamismo por membros dessas antigas religiões ganhou impulso, especialmente durante o reinado do califa Omar bin Abdel Aziz (717-719 d.C), o desafio também foi responder às questões colocadas pelos novos participantes na fé islâmica. Imã Abu Hanifa levantou-se para o desafio. Ele considerou Fiqh como um processo dinâmico, aplicável em todas as idades e em todos os locais. Nenhum jurista do futuro seria deixado sem as ferramentas necessárias para procurar soluções para os problemas específicos enfrentados por ele em seu próprio espaço e tempo.

É importante aqui elaborar os termos Shari’ah e Fiqh, pois os dois são usados às vezes indiferentemente como se fossem sinônimos, coisa que eles não são. Shari’ah é a Lei eterna e inalterável do Divino e aplica-se à natureza, à história, bem como a questões societárias. O fato de o sol nascer do leste é Shari’ah. O fato de as ondas eletromagnéticas levarem mais de oito minutos para alcançar a terra a partir do sol é Shari’ah. Se a Terra estivesse mais perto do sol, seria muito quente. Se a terra estivesse mais longe, ficaria muito frio. Em ambos os casos, a vida neste planeta seria impossível. O fato de que a terra está dobrada em um nicho seguro, acoplado a uma estrela de tamanho médio, em um canto seguro da nossa galáxia que gira em sua própria órbita é Shari’ah. O fato de que os indivíduos e as nações acabarão por se destruir se violarem a justiça é Shari’ah. Oração é Shari’ah. Assim são caridade, jejum, zakat e hajj.

Fiqh é a dimensão histórica da Shari’ah. É a tentativa humana de aplicar a Shari’ah analogamente, ao mandamento divino de criar padrões divinos na terra. O fiqh define os comos, que, quem e quando e o que são pertencentes a Shari’ah. O processo do Fiqh é um equilíbrio dinâmico entre a aplicação da Misericórdia Divina e a Ira Divina, com a justiça atuando como princípio de governo. O Alcorão e o hadith explicam claramente que a Divina Misericórdia antecede preponderantemente a ira Divina (Alcorão, 11: 119). As dimensões da Shari’ah são sem fim. As dimensões do Fiqh são finitas e têm hudood (limites) bem definidos.

O Fiqh Hanafi, que evoluiu como uma consequência dos ensinamentos do Imã Abu Hanifa, oferece cinco fontes para o desenvolvimento do Fiqh: o Alcorão, a Sunnah do Profeta, os Ahadith confirmados, o Ijmah (consenso) dos Companheiros, Qiyas (É o processo de analogia dedutiva em que os ensinamentos de aHadith são comparados e contrastados com os do Alcorão, a fim de aplicar uma liminar conhecida (nass) a uma nova circunstância e criar uma nova liminar. Aqui, a decisão da Sunnah e do Alcorão podem ser usadas como um meio para resolver ou fornecer uma resposta a um novo problema que pode surgir.) e Istehsan (É um termo em árabe para “preferência” jurídica. No seu sentido literal, significa

‘considerar algo bom’. Os estudiosos muçulmanos podem usá-lo para expressar sua preferência por julgamentos particulares na lei islâmica sobre outras possibilidades.). As diferentes escolas de Fiqh diferem sobre a importância dessas cinco fontes. A escola de Maliki, que cresceu em Medina no coração do mundo islâmico, aceita o Alcorão, a Sunnah do Profeta e o Ijma coletivo de todos os Companheiros como fontes do Fiqh, mas rejeita Qiyas e Istehsan. A escola Shafii exige que o Ijmah dos Companheiros seja universal, como o Maliki Fiqh, mas, ao contrário do Maliki Fiqh, aceita o princípio de Qiyas em circunstâncias excepcionais. O Shafii Fiqh rejeita Istehsan como os Ithna Ashari Fiqh. O Hanbali Fiqh é o mais rigoroso de todos. Aceita apenas o Alcorão, a Sunnah verificada do Profeta e o consenso universal dos Companheiros como fontes de Fiqh.

As escolas sunitas aceitam a reciprocidade das quatro principais escolas de Fiqh, a saber, Hanafi, Maliki, Shafii e Hanbali. Eles diferem apenas na sua ênfase nas fontes de Fiqh.

Foi o gênio, Imã Abu Hanifa que deixou um legado de jurisprudência e os princípios mais amplos que praticamente qualquer jurista em qualquer momento e em qualquer lugar poderia usar. Al Madhab al Qiyas, por exemplo, é a ciência da analogia. Qiyas significa literalmente medir, colocar algo em equilíbrio. Onde uma injunção direta do Alcorão e da Sunnah do Profeta não está disponível, o princípio de Qiyas permite que o jurista use a força da analogia, para medir a preponderância de evidências e oferecer uma opinião legal sobre uma questão jurídica. Da mesma forma, onde surge uma situação inteiramente nova que não estava prevista em tempos anteriores, o princípio de istehsan (derivado da raiz ha-sa-na, que significa o que é bonito ou preferido) fornece a um jurista a independência de Ijtihad (que significa um esforço intelectual rigoroso para chegar a uma opinião legal).

Os princípios de Qiyas e istehsan estão disponíveis para o grande número de muçulmanos que vivem como minorias na Índia, China, Europa e América para aplicar a Shari’ah e deduzir opiniões legais que atendam aos requisitos de seu contexto social, político e econômico. Por exemplo, no século XIII, no auge da destruição mongol, o grande cientista Nasiruddin al Tusi (1201 – 1274 d.C) aplicou os princípios de istehsan para desenvolver uma escola de akhlaq (aprimoramento de caráter) chamada akhlaq e Nasiri. Esta escola tornou-se mais tarde a base do currículo nas escolas Mogul na Índia. Através de sua própria iniciativa, Imã Abu Hanifa deixou as portas abertas para as minorias, portas estas que andam fechadas nos últimos tempos. Este é o legado dele. Essa é a grandeza dele. Não é de admirar que ele seja referido como al Shaykh al A’zam (o grande Shaykh). Se alguma vez um Fiqh para minorias, al Fiqh al akhliya (Minq Minh) foi desenvolvido (ao contrário das escolas existentes de Fiqh que são todas Fiqh al Aghlabiya, o Fiqh da maioria ou o grupo dominante), o crédito para a sua fundação deve ir para Imam al A’zam, Abu Hanifa.

O Imã Abu Hanifa foi um comerciante bem sucedido e em seu mu’amilaat (transações comerciais) demonstrou uma adesão fastidiosa aos princípios da Shari’ah. É relatado que uma o Imã deu um empréstimo a um homem para construir uma casa. No ano que seguinte, em um dia de verão quente, quando o Imã andava pelas ruas de Basra, sentiu-se cansado e pausou brevemente à sombra de uma casa. Quando perguntou de quem era a casa, foi-lhe dito que a casa pertencia ao homem a quem o Imã havia dado o empréstimo. O Imã estava aterrorizado por ter tomado um Idhafa (um aumento) no empréstimo, aproveitando a sombra da casa, e no Dia do Juízo Final ele teria que responder por suas ações porque o ato de se refugiar na sombra de uma casa para a qual ele havia dado um empréstimo pode ser interpretado como riba (usura). Em seguida, Imã Abu Hanifa perdoou o empréstimo.

Mesmo mantendo o rigor de seus princípios, o grande Imã era muito humano e tinha um bom senso de humor. Uma vez que um homem lhe perguntou sobre tomar um banho no rio Tigris “Eu deveria me direcionar a qibla quando eu me lavar?”, perguntou o homem. “Não!”, Respondeu o Imã: “Você deve direcionar-se ao banco do rio e observar suas roupas”.

Seu sucesso e sua grandeza causaram no estabelecimento político dos tempos ciúmes dele. Em 766 d.C, Califa al Mansur pediu ao Imã Abu Hanifa para ser o chefe Kadi de Bagdá. O califa esperava que, oferecendo-lhe um alto cargo, ele pudesse levar o Imã sob seu controle. Mas o grande mujtahid, ao longo dos tempos, recusou os favores dos reis e nobres para manter sua independência. Abu Hanifa recusou o convite do califa. O califa, furioso que seu convite foi rejeitado, fez o Imã ser açoitado e colocado na prisão. Mesmo em sua prisão, o Imã continuou a ensinar e treinar seus discípulos. E foi na prisão que este grande mujtahid deu seu último suspiro. Foi o ano 767 d.C. A homenagem a este gigante entre os estudiosos é que a grande maioria dos muçulmanos em todo o mundo, de Istambul a Dhaka, de Samarqand ao Cairo, usam o Fiqh desenvolvido por este grande mujtahid. Os princípios de Qiyas e Istehsan, desenvolvidos pelo Imã Abu Hanifa, fornecem os processos que podem ser usados pelos muçulmanos da América e da Europa no século XXI, tal como foram usados pelos muçulmanos de Kufa no século VIII. Esses princípios fornecem as ferramentas intelectuais que podem ser usadas para desenvolver um Fiqh para minorias (al Fiqh al Akhliyya) que ainda não apareceu no mundo islâmico.

Fonte : https://historyofislam.com/contents/the-classical-period/imam-abu-haneefa/

Sobre a Redação

A Equipe de Redação do Iqara Islam é multidisciplinar e composta por especialistas na Religião Islâmica, profissionais da área de Marketing, Ilustração/Design, História, Administração, Tradutores Especializados (Árabe e Inglês). Acesse nosso Quem Somos.